quarta-feira, 31 de agosto de 2022

SER IGREJA?

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A Missa tinha acabado, mas ele ficou mais um pouco sentado na igreja a pensar.

Era estranho, pensou ele, ver que muita gente que ali vinha ao Domingo para a Missa, (ele incluído), não se cumprimentavam quando chegavam, nem com um simples sorriso, a não ser aqueles que nitidamente se conheciam no dia a dia.
E era estranho, porque dizendo-se filhos de Deus, então eram todos família e as famílias quando se reúnem cumprimentam-se, até efusivamente, quanto mais não seja porque é bom estarmos juntos.

Afinal, como se ensina, a Igreja são os filhos de Deus reunidos em assembleia e, então, todos os que ali estiveram são Igreja, filhos do mesmo Pai, irmãos em Cristo, templos do Espírito Santo.
Até têm todos a mesma Mãe, que nos foi dada por seu Filho Jesus Cristo.
Então não se deveriam cumprimentar em alegria quando se reúnem?
Tudo leva a crer, pelo que está escrito, que assim era nos primeiros tempos.

Outra coisa que lhe despertou a atenção foi o momento da consagração e o momento da comunhão.
Obviamente que não são momentos de bater palmas, de rir ruidosamente, de dar vivas, sequer de fazer barulho, mas deveriam ser pelo menos momentos de grande união, momentos de grande felicidade exposta nos rostos, momentos realmente muito vividos e, apesar de em muitos assim acontecer, parecia-lhe que também muitos viviam aqueles momentos como um qualquer outro momento, ou seja, como uma rotina quase indiferente.

Veio-lhe à cabeça a imagem de um estádio de futebol cheio de gente e como os adeptos de cada equipa vibravam com o jogo.
Na altura do golo todos os da mesma equipa saltavam, gritavam, alegravam-se e até se abraçavam, mesmo aqueles que não se conheciam pessoalmente mas que se identificavam como sendo da mesma equipa.
Pareciam todos irmanados na mesma alegria!
É curioso, pensou ele, que todos eles se alegram porque um jogador mete um golo e vivem-no como se fosse de cada um, mas afinal o golo é do jogador que o meteu.

Mas a verdade é que na Missa, sendo todos celebrantes, todos “metem golo” e por isso todos são de Cristo e Cristo é de todos!
Sorriu interiormente pensando que à “equipa de Deus” lhe faltava aquele “entrosamento”, para usar termos futebolísticos!

Havia tanto para pensar, mas quedou-se nos momentos finais da celebração.
Alguns nem sequer esperavam pela bênção final e uma maioria saía apressadamente como se tivessem algo mais importante para fazer.
E mais uma vez, nem um cumprimento, nem um sorriso, a não ser aqueles que já se conheciam.
Parecia que tudo tinha acabado e que a celebração não tinha deixado “marcas”, fossem elas quais fossem.

Inevitavelmente veio outra vez ao seu pensamento o jogo de futebol e era fácil de perceber que os adeptos da equipa vencedora não queriam arredar pé do estádio, festejando a vitória, e mesmo de saída, riam, davam vivas e até colocavam os braços por cima uns dos outros, saboreando a vitória o máximo tempo possível.
Haviam de chegar a casa, ao café ou ao bar e haviam de contar entusiasmados a outros o desenrolar do jogo e a vitória tão saborosa que tinham vivido.

Lembrou-se, mais uma vez com um sorriso, que os clubes guardam as taças que ganham lá nas sedes dos clubes e, no fundo, essas taças pertencem ao clube e não aos sócios.

Mas em Igreja e sendo Igreja a “Taça” é de todos e todos “A” transportam com eles em cada momento!

Que bom seria, pensou ele, a começar por si próprio, se todos os outros pudessem perceber que cada membro da Igreja traz Cristo consigo, e, por isso mesmo, dá testemunho da alegria de O ter e conta entusiasmado a todos, (com a devida sensatez), como é saboroso, (para usar termos de Salmos), e bom, comungar Cristo e vivê-lO no dia a dia.

Como seria fantástico deixarmo-nos entusiasmar por Deus e assim unidos em Igreja sermos realmente filhos de Deus que se unem, se conhecem, se ajudam e se amam mutuamente.

Já se fazia tarde e a igreja estava vazia, por isso ajoelhou-se frente ao sacrário e disse numa oração:
Fica comigo, Senhor, porque afinal ser Igreja não é nada fácil, mas é muito bom!!!



Marinha Grande, 31 de Agosto de 2022
Joaquim Mexia Alves

terça-feira, 16 de agosto de 2022

DIÁLOGOS COM O SENHOR DEUS 23

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O que pensas tu que é a oração?
Eu, Senhor?


Sim, tu. É a ti que me dirijo e pergunto: O que pensas tu que é a oração?
Oh, Senhor, e sei lá eu responder-Te a essa pergunta! Tu é que tens de me ensinar a orar, pelo Teu amor, Senhor eu to peço.


Eu ensino-te todos os dias, meu filho, quando o Espírito Santo te impele a pensar em mim, a dirigires-te a mim, a sentires a minha presença na tua vida. Por isso pergunto-Te novamente: O que pensas tu que é a oração?
Oh, Senhor, eu penso que orar é procurar-Te com amor, é sentir-Te com amor, é falar-Te com amor. Mas eu, Senhor, embora Te procure, embora Te sinta, embora Te fale, ainda acho que não sei orar.


Então pensas tu que as palavras são mais importantes?
Que a tua postura é mais importante?
Que a tua sinceridade é mais importante?
Sei lá, Senhor, penso que tudo isso e muito mais é importante na oração.


Sabes, meu filho, o que é mais importante quando orares?
Não, Senhor. Diz-me, por favor!


O mais importante, meu filho, é o teu desejo de Mim, o teu coração aberto para mim, a tua vontade íntima de fazer a minha vontade. O resto, (que é importante também), deixa Comigo porque eu sei bem o que desejas e precisas.
Obrigado, Senhor, e atrevo-me a perguntar: Estive a orar, Senhor?


Claro, meu filho! Não está em ti esse desejo de Mim, de Me encontrares, de quereres ser nada para Eu ser tudo em ti?
Sim, Senhor, pelo menos é isso que eu desejo que assim seja, quando Te procuro e a Ti me entrego.


Então, meu filho, aí tens a oração que se faz vida em ti!
Obrigado, Senhor!




Monte Real, 16 de Agosto de 2022
Joaquim Mexia Alves

sábado, 6 de agosto de 2022

OS PADRES

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Os Padres são, hoje em dia, uma espécie de “bombos da festa”!
Tudo e toda a gente “malha” nos Padres, em letra maiúscula de propósito.

Começa, (sei lá bem onde começa?), pelos leigos, pelos paroquianos, passa pelos ditos católicos que não “vão” à Igreja e lhes dá jeito os problemas de alguns padres para não irem, (aqui com letra minúscula de propósito), pelos políticos, (é tão bom que falem dos outros e esqueçam a “porcaria” que fazem todos os dias), pelos ditos jornalistas, que de jornalistas nada têm, mas apenas de fazedores de suspeitas, de difamações, de manipulações, passa até pelos que cometem os terríveis pecados que alguns, poucos, padres cometem, porque assim ninguém olha para eles, enfim, é um nunca acabar de gente a criticar, a julgar, a condenar, os Padres, normalmente na praça pública.

Infelizmente, até na própria Igreja, mesmo aos mais altos níveis, os Padres são objecto e razão para permanentes críticas e admoestações, porque são clericalistas, porque são conservadores, porque são progressistas, porque isto, porque aquilo, esquecendo-se essa mesma hierarquia de, pelo menos de vez em quando, os presentear com o reconhecimento do trabalho feito em tanto lugar e tantas vezes em momentos e lugares tão difíceis.

Quem vive com os Padres no seu dia a dia, quem com eles colabora no intuito de servir a Deus, percebe como tantas vezes é injusta a maneira e o modo como os Padres são tratados.

Quem cuida de saber se estão cansados, se celebram mais Missas do que deviam, intercalando com funerais, baptizados, casamentos e “outras coisas mais”?

Se confessam e nada dizem, não valeu a pena a confissão. Se confessam e tentam dar conselhos e ajudar a encontrar caminho, são uns “chatos”, quando não uns convencidos que pensam saber mais do que os “confessados”!

Se nas homílias tentam dar testemunho das suas vidas servindo-se das Leituras e do Evangelho, é porque estão a falar de si próprios, se falam apenas da Palavra e A tentam explicar com mais profundidade, têm a mania que são “teólogos”, se sorriem, riem e estão bem dispostos, é porque não percebem a “dignidade” do que estão a fazer, se estão de cara séria e chamam a atenção para os erros que todos praticamos, têm a mania que são melhores do que os outros.

A lista é interminável, mesmo sem fim, e aplica-se sempre aos Padres que acabam por pagar pelos erros dos outros, padres como eles também.

Então isso quer dizer que não se deve dar atenção e conhecer e punir os actos vergonhosos de alguns padres?
Claro que não!
Tudo isso deve ser apurado até ao fim e com toda a força da lei canónica e civil, doa a quem doer, mas que envolva também todos os outros sectores da sociedade onde tal acontece também.

As outros, filhos de Deus também, mas que nEle não acreditam, é prova mais do que acabada que Deus não existe, que a Igreja é uma “fantochada”, e que tudo isso devia acabar de imediato.
No entanto, não são capazes de tomar a mesma atitude, por exemplo, perante a política, pois sabendo que há políticos corruptos, reconhecem que há bastantes que o não são.

Aqueles que se dizem cristãos católicos e se afastam da Igreja por causa do pecado gravíssimo de alguns padres, (bem poucos no universo geral), ainda não perceberam que a Igreja não são os Padres, somos nós todos reunidos em nome de Deus.

Àqueles que se sentem envergonhados pelo comportamento inaceitável e pecaminoso de certos padres, obrigado, porque são Igreja e sofrem com a Igreja que são.

O texto não teria fim porque, infelizmente, é muito vasto o assunto e exige de nós cristãos católicos muita oração pelos Padres e pelos padres que prevaricam gravemente, bem como pelas suas vítimas.

Eu, pessoalmente, dou graças a Deus pelos Padres, orgulho-me de conhecer e ser amigo de muitos deles e agradeço-lhes do fundo do coração a sua entrega, mais ainda nestes momentos tão difíceis em que seria bem mais fácil “abandonar a barca”, e sobretudo o dom de trazerem Deus nos Sacramentos ao povo que O adora e nEle sempre confia e espera.

Amemos os nossos Padres, por eles pedindo sempre e pedindo ao nosso Papa Francisco e aos nossos Bispos que os acarinhem e reconheçam a sua dedicação profunda, não os criticando tantas vezes como se fossem eles os “culpados” de tudo o que não corre tão bem na Igreja.

Só Deus sabe o seu enorme sacrifício, a sua persistência, perante tantos e tão variados ataques e incompreensões com que as suas vidas são escrutinadas, a maior parte das vezes apenas para dizer mal e interpretar falsamente os seus gestos e atitudes.

O texto é cáustico, muito, eu sei, mas dói-me profundamente que a enorme maioria de Padres que deram e dão a sua vida por Cristo, estejam num frenesim de ataques que toma sempre a “nuvem por Juno”.

A vós Padres todos que, humanamente, resistis às tentações, que reconheceis as vossas fraquezas, mas vos mantendes firmes na fé, ajudando-nos a vivê-la em Igreja por Cristo, com Cristo e em Cristo, OBRIGADO!

Rezo por vós e dou graças a Deus por todos e cada um que permanece fiel ao seu sacerdócio, tudo e só para a maior glória de Deus.



Marinha Grande, 6 de Agosto de 2022
Joaquim Mexia Alves

segunda-feira, 25 de julho de 2022

“FISIOTERAPIA ESPIRITUAL”

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Comecei hoje a fazer fisioterapia por causa das minhas costas, nada de grave, mas para tornar a vida melhor, mais agradável.

Fui aproveitando aqueles momentos sozinho para ir rezando o terço, (o terço também tem isto de bom, pois em qualquer lado se reza para dentro em surdina), e pensando, pensando, pensando…

Parece-me, então, que devo que acompanhar esta fisioterapia física com uma “fisioterapia” espiritual.

Muitas vezes a fisioterapia é precisa porque nos vamos defendendo das dores, vamos adoptando posições confortáveis em que não doa, e de tal modo o fazemos que a certa altura estamos “tortos fisicamente” e já não nos conseguimos endireitar.
Então, lá temos que passar pela fisioterapia, que é sempre desagradável, por vezes um pouco frustrante e outras vezes até ligeiramente dolorosa, para podermos recuperar, atingir novamente a plena mobilidade e o bem estar da vida saudável.

Ora, tenho para mim, que também preciso de uma “fisioterapia espiritual”, ou seja, reconhecer em mim aquilo em que me tornei rotineiro na oração, na prática dos sacramentos, aquilo em que não quis procurar melhor e mais longe as razões para a Doutrina da Igreja, para viver a fé com verdade, em vez de ficar no que já dei como adquirido e não quero mudar porque é muito mais confortável assim.
Não que a Doutrina tenha mudado, (Ela é emanada de Deus e Deus não muda, mas é sempre novo), mas como posso percebê-la e vivê-la melhor.

Na clínica tenho uma fisioterapeuta para me fazer os tratamentos e ajudar a corrigir posições.
Mas depende da minha vontade querer fazê-lo.

Na Igreja tenho o “fisioterapeuta” perfeito, Deus, e todos os outros, bispos, sacerdotes e leigos, que “formados” por Ele, me ajudam a tratar da alma, a sair da rotina que não me deixa andar, a perceber o que devo mudar para caminhar na fé em Deus, mais alegre, mais crente, mais activo, mais orante, enfim, mais vivo em Cristo.
E também depende da minha vontade querer fazê-lo e por isso mesmo me agarro a essa vontade e peço a Deus que aumente essa vontade em mim.

E, já me vou sentindo melhor, sobretudo porque leio o que escrevi e sorrio pensando como é que o nosso Deus de tudo retira sempre algo de muito bom para nós!

Obrigado, Senhor!



Monte Real, 25 de Julho de 2022
Joaquim Mexia Alves

sexta-feira, 22 de julho de 2022

AQUI ESTAMOS SENHOR! 72

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Fecho os olhos, baixo a cabeça e deixo que desponte em mim o desejo de Te sentir.
Pouco a pouco do meu coração sai o Teu nome que vou repetindo baixinho, em surdina: Jesus, Jesus, Jesus…
Afundo-me na cadeira em que estou sentado e parece que à minha volta tudo desparece ou, pelo menos, nada me incomoda ou distrai.

Parece-me que Te sentas no chão junto à cadeira em que estou e eu protesto de imediato:
Não, Senhor! Eu é que me sento a Teus pés!

Dizes-me então, ou sonho que me dizes:
Não te queres sentar comigo aqui no chão?

Saio imediatamente da cadeira e sento-me no chão junto a Ti, sentindo o frio das lajes frias da capela debaixo de mim.
Parece-me ver um sorriso de criança na Tua face, como se estivesses a achar graça a Ti e a mim sentados no chão da capela a olhar para Ti no Santíssimo Sacramento.

É então que me pedes para levantar a cabeça, olhas-me nos olhos, e perguntas-me candidamente:
Porque vens tantas vezes aqui?

Eu olho-Te espantado, (como se Tu não soubesses porquê!), e respondo-Te:
Para estar Contigo, Senhor!

Olhas-me ainda mais profundamente e perguntas:
Mas Tu acreditas que Eu estou aqui no Santíssimo Sacramento?

Sobressalto-me, assusto-me, e fico a pensar no que Te hei-de responder.
Depois penso que é melhor fingir que não ouvi para não ter que responder.

Mas Tu tocas-me na mão e insistes:
Então, não me respondes?

Como uma criança apanhada em falta, abro a boca e ouço-me dizer:
Sim, Senhor, acredito. Sim, Senhor, quero acreditar como todo o meu ser que estás aqui, que és Tu realmente presente na Hóstia Consagrada.

Sorris e dizes com ternura:
Mas não é fácil acreditar, pois não? De vez em quando parece-te duvidar, não é?

Fico sem jeito, mexo-me na posição em que estou e digo:
Oh, Senhor, não me provoques! Tu conheces-me tão bem! Sabes bem que eu acredito, que eu quero acreditar, mas também sabes que a minha humanidade é frágil, que a minha humanidade gosta de ver com os olhos do corpo e tocar com as mãos que Tu me deste.

Colocas o braço à minha volta, apertas-me junto a Ti e dizes-me ternamente:
Eu sei, Joaquim, eu sei. Mas concedo-te, concedo a todos os que quiserem, essa graça imensa de me poderes ver com os olhos do coração e tocares-me com as mãos da fé.
O que falta ao teu crer eu compenso com a minha misericórdia, com o Meu amor por ti, por todos vós.

Levanto a cabeça e com os meus olhos apenas vejo a Hóstia Consagrada, mas com o coração cheio de amor e confiança, digo:
Vejo-Te, Senhor! Sinto-Te, Senhor! Amo-Te, Senhor! Obrigado, Senhor!




Garcia, 21 de Julho de 2022
Joaquim Mexia Alves


Nota: Escrito ontem quinta feira 21, na tarde de adoração na Capela da Garcia

quarta-feira, 6 de julho de 2022

O ELOGIO DA VELHICE

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Deus concedeu-me a graça de ter 4 filhos.

Acredito que cada um deles me há-de pegar pela mão e ajudar a atravessar a estrada que se vai agora apresentando à minha vida .

Agora ainda acham graça às minhas expressões de dor que vai percorrendo todo o meu corpo mas sei e sinto que lá no fundo se vão preocupando com o pai que continua, apesar de tudo, forte e vivo.

Claro que as dores são fruto da idade, mas também muito fruto das asneiras da vida que levei e que foram muitas, (algumas forçadas, como a guerra, mas a maior parte de livre vontade), e tinham forçosamente de marcar os meus anos mais velhos

Um tal Variações cantava que “quando a cabeça não tem juízo o corpo é que paga”!

É engraçado começar a viver agora as recordações daquilo que, quando novo, achava daqueles que tendo a minha idade ou sendo mais velhos, iam dizendo e se iam queixando e como eu desvalorizava esses “queixumes” acreditando que eram para chamar a atenção.

Percebo agora que os nossos “queixumes” nestas idades, são muito mais para nós, são íntimos, do que para chamar a atenção dos outros.

Gostaríamos até de conseguir não nos queixarmos para não preocuparmos os mais novos, mas, caramba, às vezes nem são tanto as dores, são mais as incapacidades de fazer algo tão simples como calçar e descalçar as meias sem ter que “gemer” um pouco!

Mas é bom ser mais velho.

Dá-nos, por exemplo, a capacidade de nos calarmos para não provocar discussões, (embora tenhamos os nossos “repentes” pois claro), conseguirmos “adivinhar” reações, sabermos coisas que os mais novos ficam espantados, contarmos histórias que eles querem ouvir, (às vezes até lhes acrescentamos umas “coisas” para ficarem mais bonitas ou interessantes), lembrarmos sítios que já não existem ou tradições perdidas, enfim, somos quase uma “enciclopédia” de “banalidades” interessantes.

E é tão gratificante quando os mais novos nos pedem para repetir as histórias que já contámos vezes sem fim, mas que eles querem recordar, muito provavelmente para poderem contar quando chegarem à “idade das dores”.

Depois, também, as ofensas que nos fizeram ou nós fizemos, vão-se esbatendo e vamos percebendo o ridículo do incómodo que nos causamos por não perdoar ou não pedir perdão.
Começamos a perceber bem melhor o sentido de viver em paz.

A mim, sinceramente, nunca me preocupou a idade, (a não ser por causa das tais “incapacidades”), e acho até interessante ser olhado como mais velho.
Há sempre algum respeito nesses olhares.

A morte nunca me preocupou e hoje em dia muito menos, pois a Fé que vivo ou tento viver todos os dias, dá-me a certeza de que, mais tarde ou mais cedo, estarei nos braços de Deus, (depois de purificadas as minhas inúmeras faltas), no gozo do amor que nunca acaba.

E o amor talvez seja o melhor elogio à velhice!



Monte Real, 6 de Julho de 2022
Joaquim Mexia Alves


Nota: Claro que escrevo o que sinto e na generalidade, pois cada situação é diferente, sobretudo para aqueles que são abandonados pelos mais novos.

quinta-feira, 2 de junho de 2022

VEM, ESPÍRITO SANTO

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Pai, o que é o Espírito Santo?
Ó meu filho, fazes-me perguntas tão difíceis!

Mas eu queria saber, pai!
Deixa-me ver se te contigo explicar, porque tu ainda és muito novo para compreender certas coisas de Deus.

Ah, então o Espírito Santo é Deus?
Claro, meu filho, é Deus com o Pai e o Filho Jesus Cristo, mas isto é muito complicado de explicar.
É que sabes, são três pessoas numa só!

Então o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três, mas são só Um?
Pois, meu filho, por isso é que nós não conseguimos perceber completamente o mistério de Deus.

Ó pai, se tocarmos três notas num piano em harmonia ao mesmo tempo, são três sons que ouvimos ou é apenas um?
Pois, se assim fizermos, são três sons distintos, mas nós apenas ouvimos o “resultado final” que é um som perfeito.

Se calhar, se fossem só dois sons o som final não seria tão bonito pois não?
É verdade, filho, não tinha pensado nisso. Com efeito o terceiro som, digamos assim, cria a harmonia perfeita daqueles três sons.

Talvez, pai, este terceiro som revele a beleza dos outros dois e nos faça ouvir a harmonia deles todos juntos?
Olha, meu filho, perante esta conversa e as tuas palavras apenas posso dizer:
«Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado.» Lc 10, 21




Marinha Grande, 2 de Junho de 2022
Joaquim Mexia Alves

terça-feira, 31 de maio de 2022

O PASSARITO

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O passarito tinha ficado preso no intervalo ajardinado em frente da janela do meu escritório nas termas.
As paredes são altas e o passarito ainda novo não tinha forças para voar tão alto.
Tentou vários voos, mas infelizmente não conseguiu altura suficiente para sair do “buraco” em que tinha caído.
Lançava chilreios desesperados e os seus pais já lhe tinham vindo fazer companhia, mas não conseguiram tirá-lo da situação em que o pobre passarito se tinha metido.

Decidi que tinha chegado o momento de ir ajudar o pobrezito a sair daquela situação agarrando-o e colocando-o na rua de onde pudesse voar para o ninho.
Fui abrir a porta que dava para o “buraco” ajardinado, mas o passarito num derradeiro esforço conseguiu levantar e chegar à berma do alto da parede.
Ouço agora os seus chilreios, mas já são de alegria, os dele e todos os outros que se lhe juntaram.

E ao acabar de escrever tudo isto que agora se passou à minha frente, apenas vem ao meu coração um versículo bíblico: «Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado.» Lc 15, 32

Quantas vezes não estamos nós em situações em que nos deixámos cair e nos parece que delas não conseguimos sair?
Vêm outros e tentam ajudar-nos, mas nós ainda não encontrámos forças para sairmos daquela situação.
É que há situações em que por culpa nossa caímos, mas que por muito que nos que nos queiram ajudar e ajudem, o último esforço tem que ser nosso, da nossa vontade, para conseguirmos vencer a situação.

E estamos sós nessa luta derradeira para vencer esse momento?
Claro que não!
Deus está connosco e o amor do Pai e do Filho derramam o Espírito Santo em nós, que nos dá forças e asas de confiança e esperança, para voarmos em liberdade.

É muito bom e gratificante ver em tudo a mão de Deus!




Monte Real, 31 de Maio de 2022
Joaquim Mexia Alves

terça-feira, 24 de maio de 2022

A MORTE NO AMOR

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Olho a inevitabilidade da morte, sobretudo quando acontece nos mais novos do que eu, e fico a pensar que, realmente, só permanecendo em Cristo a morte tem sentido.

Claro que este sentido da morte é muito difícil, diria quase impossível de perceber aos que ficam por cá e sentem e choram a ausência dos que partiram, mas se a mais nada nos podemos “agarrar”, temos, no entanto, a certeza de que permanecendo em Cristo como Ele vivemos para sempre.

E isso mitiga a nossa dor, o nosso sofrimento?
Talvez não, porque nos é quase impossível suportar a ausência dos que amamos.

Mas eles, os que partiram permanecendo em Cristo, gosto de os ver, de os sentir como Jesus Cristo dizendo: «Se assim não fosse, como teria dito Eu que vos vou preparar um lugar?» Jo 14, 2

Não podemos saber os mistérios de Deus, mas sabemos pela fé que em tudo Ele quer apenas e só o nosso bem, a nossa salvação, e que mesmo aquilo que nos é, por vezes, quase insuportável de viver, acaba por se tornar num bem maior que conheceremos um dia, se nEle permanecermos e nEle morrermos para viver eternamente.

O amor não morre, nunca morre o verdadeiro amor e, por isso, quem vive no amor, não morre naqueles que o amam, porque o amor verdadeiro é Deus e vem de Deus e quem permanece em Deus vive no amor que se faz presente eternamente nos que estão em Deus e nos que esperam para estar em Deus na plenitude do amor.

«À ida vão a chorar … no regresso cantam de alegria» Sl 126




Monte Real, 24 de Maio de 2022
Joaquim Mexia Alves

sexta-feira, 13 de maio de 2022

DEIXAR-SE TOCAR PELO ESPÍRITO SANTO

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Não sei como se faz para tal acontecer.
Sei que é um desejo profundo que nasce dentro de nós e que nos abre à Sua presença.
É Ele, o Espírito Santo, que desperta em nós esse desejo profundo.

E então há momentos em que tudo desaparece!

Ficamos sozinhos, assim no meio dos Três, do Pai, do Filho e do Espírito Santo e tudo se transforma.
Uma alegria imensa e uma serenidade suave tomam conta de nós e tudo nos parece mais belo, mais colorido, mais vivo!
O mundo está à nossa volta, temos consciência disso, mas não nos confunde, não nos tenta, não nos incomoda, porque o momento é todo dEle.

Sentimo-nos amados, mas com um amor que não tem fim, que não tem palavras, que não tem dimensão.
Vai para além do compreensível, mas compreende-se inteiramente no momento que nos envolve.

Não vemos os outros, mas sabemos que estão à nossa volta, uns mais perto e outros mais longe, e esse amor que nos atinge faz-nos amá-los naquele momento mais do que a nós próprios, de tal modo que até nos oferecemos por eles.

É o momento em que somos um pouco divinos, não porque o sejamos, mas porque Ele nos concede a graça de sê-lo no amor que em nós derrama, para O amarmos acima de todas as coisas e nEle amarmos os outros como a nós mesmos.

Por vezes, (só percebemos depois), caem lágrimas dos nossos olhos, que são oásis num deserto que então se torna vivo.

Quanto tempo dura o momento?
Não sei!
Sei que me deixo perder nesse momento, que embora dure apenas uns instantes, vive-se como uma eternidade.

E quando vêm os tempos de secura, em que Ele está, mas não se sente, lembramo-nos sempre que a seguir “à tempestade vem a bonança”, e nasce em nós sempre e novamente o desejo profundo da presença do Espírito Santo, que nos mostra o Filho no amor do Pai.

Vem Espírito Santo!



Monte Real, 13 de Maio de 2022
Joaquim Mexia Alves


Nota: Acabado de escrever o texto, lembro-me do 13 de Maio, sorrio e interiormente penso que a nossa Mãe do Céu, em Fátima, vai continuando, ininterruptamente, a pedir o Espírito Santo para cada um de nós, como fez em Pentecostes.

sábado, 7 de maio de 2022

OS NÓMADAS

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Estive hoje na Batalha com o grupo de oração “Os Nómadas”, do qual faço parte, (embora à distância), porque reúnem à quarta feira Centro Paroquial dos Jerónimos, em Lisboa.

Hoje tivemos um encontro/peregrinação na Batalha, com celebração da Missa, com a sempre pronta disponibilidade do meu querido amigo Pe Armindo, que foi o momento alto deste encontro/peregrinação, porque sendo poucos os presentes, pudemos estar à volta do altar durante a consagração e oração eucarística, num tempo de interioridade e intimidade com Jesus Cristo, presente na Eucaristia.

“Os Nómadas” são um grupo de homens de diversas idades, mas todos irmanados na comunhão em Cristo, no amor do Pai, guiados pelo Espírito Santo, com uma profunda devoção mariana.

E é muito bom sentir esta irmandade, esta comunhão, sem receios, nem vergonhas humanas, que levam, por exemplo a, no meio da rua e frente à capelinha da Senhora do Caminho, rezarmos a oração própria deste grupo, e também, no restaurante sentados para almoçar, benzermo-nos e fazermos uma oração de graças por tudo quando Deus nos dá.

E não falámos apenas de religião, e da fé, embora bebamos uns dos outros as experiências e vivências de cada um, mas, tendo no grupo dos Irmãos Nómadas, profundos conhecedores de História, a visita ao Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, transforma-se em algo vivo, diria, quase presente no espaço e no tempo.

Deus fala-nos de muitos modos e um deles, sem dúvida, é através da História, mostrando-nos os erros e as verdades, que são caminho dos povos, muitas vezes afastando-se infelizmente de Deus, e outras aproximando-se e depositando em Deus a sua confiança e esperança.

As acaloradas discussões, (no bom sentido), são sempre recheadas de amizade e encontro, e onde há união e comunhão, Deus faz-se presente.

Obrigado a todos, porque hoje, sendo perto da “minha porta”, pude estar com os Irmãos Nómadas, e sobretudo, obrigado a Deus por me/nos ter proporcionado este dia de encontro com Ele, que se faz sempre presente nas vidas de cada um.



Marinha Grande, 7 de Maio de 2022
Joaquim Mexia Alves

segunda-feira, 18 de abril de 2022

DIÁLOGOS COM O DIABO (16)

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Diz ele: Vocês acreditam em cada coisa! Então o Homem era Deus e deixava-se morrer assim!
Se fosse Deus fazia um gesto, nem precisava de um gesto, mas apenas um pensamento e tudo ficava resolvido com os seus inimigos derrotados.


Digo eu: Pois! Mas ainda não percebeste que para Ele todos aqueles não eram seus inimigos? Eram apenas gente que “não sabia o que fazia”! Não percebeste que Ele veio para salvar todos! Mesmo todos!




Diz ele: Então e julgas que aqueles que O crucificaram se salvaram?

Digo eu: Não sei! Mas eu não julgo nem posso julgar porque não sei o que aconteceu na vida de todos eles. Ele é que julga e sabe se o arrependimento em algum momento tocou aqueles corações.


Diz ele: És um ingénuo! Parece que ainda acreditas em “contos de fadas”!

Digo eu: Em “contos de fadas” não acredito, mas acredito no amor infinito e eterno de Deus. E o amor infinito e eterno de Deus tudo pode, desde que o homem se abra a Ele.


Diz ele: A verdade é que se Ele se fosse Deus podia ter-se salvo a Si mesmo e afinal não o fez porque não podia!

Digo eu: Posso responder-te de dois modos que obviamente não esgotam a resposta:
O primeiro, e de modo simbólico, é que realmente não podia salvar-se a Si mesmo porque o seu amor pelos homens o levava a entregar-se por eles e se se salva-se apenas a Si mesmo de nada teria servido a sua vinda até nós e como nós.
O segundo é que a salvação de cada um só faz sentido com a salvação de todos os outros.
Ele não veio dizer-nos cada um por si. Veio dizer-nos e chamar-nos a amarmo-nos uns aos outros até à entrega pelos outros. Aquele que o faz é que é o «verdadeiro amigo»!


Diz ele: Então também acreditas, se calhar, que Ele ressuscitou?

Digo eu: Claro que acredito! Mais do que acredito, vivo a sua Ressurreição como verdade última da vida que Ele me deu na certeza de que, por sua graça, morrendo com Ele, com Ele também ressuscitarei.


Diz ele: Não me digas que nunca tens dúvidas?

Digo eu: Ah, sim tenho dúvidas. Claro que tenho. Mas essas dúvidas coloco-as nas minhas orações e Ele responde-me sempre, e de tantos modos, fortalecendo um pouco mais a minha fé.
Não há mal nenhum em ter dúvidas. Mal existe sim em querer permanecer nas dúvidas que é aquilo que tu queres que nós façamos.


Diz ele: Não se pode conversar contigo, porque tu não queres pensar racionalmente, mas sim deixar-te levar por uma fé cega.

Digo eu: Aí é que te enganas e é isso que te incomoda. Penso racionalmente e por isso mesmo é que tenho dúvidas e por isso mesmo é que a minha fé não é cega, mas sim iluminada por Ele que nunca deixa os seus à tua mercê.
Por isso afasta-te de mim e deixa-me viver a alegria do Senhor Jesus ressuscitado!



Monte Real, 18 de Abril de 2022
Joaquim Mexia Alves

domingo, 17 de abril de 2022

PÁSCOA 22










No caminho para o meu coração encontro uma mulher apressada, com uma expressão no rosto de espanto esperançoso e repetindo sem cessar: O corpo dEle não está lá!!!

Não alcanço bem o que quer dizer, mas percorro também esse caminho até ao meu coração à procura do lugar onde Ele deve estar sepultado, mas não O encontro.
Apenas vejo os vestígios de ali ter estado.

Uma esperança enorme desponta em mim e eu quero acreditar, com todo o meu ser.

Fico a olhar para o “túmulo” no meu coração, sem perceber, e ouço uma voz que me diz: «Porque procuras entre os mortos O que está vivo?»

E de repente a Verdade atinge-me porque O sinto no meu coração e uma alegria incontida toma conta de mim.

Abro a boca e solto um grito:
Ressuscitou! Jesus Cristo ressuscitou!

E começo, também eu a correr, e a gritar:
Vi o Senhor! Vi o Senhor!

Onde?
Perguntam-me uns quantos.

Eu respondo que já não é naquele “túmulo”, mas sim que Ele quis fazer morada no meu coração.

E eles perguntam-me: Podemos vê-lo também!

E eu respondo dizendo para O procurarem nos seus corações, vivo e real, porque Ele ressuscitou e é vida em cada um que quiser acreditar.

E continuo a correr, sem me deter, e sempre a proclamar, bem alto, para toda a gente ouvir:
Ressuscitou! Jesus Cristo ressuscitou!



Marinha Grande, 17 de Abril de 2022
Joaquim Mexia Alves

quinta-feira, 14 de abril de 2022

A CEIA

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Era quinta feira, anoitecia e Pedro caminhava apressado para o abrigo onde normalmente serviam uma refeição quente aos sem abrigo, aos abandonados, aos esfomeados, aos necessitados.

Admirou-se quando chegou por ver uma multidão de gente à espera para entrar e pensou que não teriam comida para toda aquela gente.
Foi dizendo boa noite a todos, pedindo-lhes para esperarem um pouco e entrou na sala onde João e os seus dez companheiros iam arrumando tudo para poderem começar a servir as refeições.

Chamou João e os outros dez e foram à cozinha, onde um grupo de mulheres, coordenadas por uma outra chamada Maria, enérgica, mas com uma bondade incrível, preparavam a comida para o jantar.
Pedro disse a todos: Está uma multidão de gente lá fora para comer. Não sei como vai ser pois não temos comida para todos, sejam muito parcimoniosos na distribuição da comida para ver se podemos, pelo menos, dar qualquer coisa a cada um.

Abriram então a porta e de imediato a sala ficou cheia, tendo ainda ficado muita gente do lado de fora.
Pedro ainda disse aos que estavam de fora para esperarem um pouco pois iam ver se conseguiam arranjar alguma comida também para eles.

Quando se preparavam para começar a servir, Pedro reparou que na mesa logo à saída da cozinha estava um homem cuja presença chamava a atenção, tal era a tranquilidade que dele emanava e o olhar terno e amoroso com que olhava para toda a gente.
Aproximou-se dele e disse-lhe: Escolheste bem o lugar, porque aqui logo à saída da cozinha não te faltará com certeza alimento.

O homem olhou para ele, com um olhar que trespassava de amor e disse-lhe em tom suave mas com uma autoridade inquestionável: Olha Pedro, quero pedir-te que quando trouxerem as travessas com a comida da cozinha, as apresentem primeiro a mim, antes de servirem os convidados.

Pedro nem sequer questionou porquê, pois até já tinha ficado admirado com o facto de o homem saber o seu nome.
Chamou todos os outros à cozinha e disse-lhes para fazerem exactamente o que o homem lhe tinha dito, e pediu ainda mais uma vez para irem alertando as pessoas que estavam na sala, para o facto da comida ser escassa e poder não chegar para todos.
Ouviu-se então a voz de Maria, aquela que coordenava na cozinha, dizer: Olhem. «Façam tudo o que esse homem vos disser!» Jo 2, 5

E começaram a servir.
Cada travessa que saía da cozinha era apresentada ao homem que estava na primeira mesa, ele levantava os olhos para o alto, murmurava uma qualquer prece e abençoava as travessas.

Só passado pouco tempo é que Pedro, João e os seus dez companheiros se aperceberam que os que estavam na sala já todos tinham comido e ficado bem saciados, que outros tinham entrado e comido também, porque as travessas que entravam vazias na cozinha saíam cheias de comida para a sala sem ninguém perceber como.

Quando a refeição acabou e todos saíram, o homem, que ainda não tinha comido, chamou Pedro, João e os outros dez e pediu-lhes: Sentai-vos comigo aqui à mesa e comamos juntos.
Sentaram-se rodeando-o e olhando para ele com um misto de curiosidade, de espanto, mas também de uma esperança que não conseguiam perceber.

O homem disse-lhes então: Estais admirados com o que se passou? A verdade é que saciámos a fome a muita gente e «fostes vós mesmos que lhes destes de comer». Lc 9, 13
Mas saciámos-lhes apenas a fome do corpo, porque a fome do espírito, a fome do amor, a fome da liberdade, a fome da vida, só eu a posso saciar.

Reclinaram-se todos sobre a mesa olhando fixamente o homem e sentindo a paz extraordinária que dele emanava e naquele momento ali se sentia.

O homem olhou-os profundamente, tomou nas suas mãos um pão partiu-o e deu-o a todos eles dizendo: «Tomai, comei, isto é o meu corpo.». Mt 26, 26
Depois tomou o cálice, deu graças e deu-o a todos dizendo: «Bebei dele todos. Porque isto é o meu sangue, o sangue do Novo Testamento, que é derramado por muitos, para remissão dos pecados.» Mt 26, 28


«Foi então que, de repente, os seus olhos se abriram e O reconheceram» Lc 24, 31



Marinha Grande, 14 de Abril de 2022
Joaquim Mexia Alves

quinta-feira, 31 de março de 2022

DIÁLOGOS COM O SENHOR DEUS 22

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Porque duvidas sempre ao fazeres o que te peço, servindo-me de outros?
Oh Senhor, porque sou orgulhoso, vaidoso e receio quando me pedem para falar, eu o faça para “dar nas vistas”, para ser elogiado, e então tenho medo de errar e sentir humilhação em relação aos outros, claro.

Mas, meu filho, se alguém te chama a falares em Igreja, a dar testemunho do que aprendeste, viveste e vives, não acreditas que sou Eu que te chamo a fazê-lo?
Sim, Senhor, quero acreditar nisso mesmo. Mas mesmo assim o meu ser orgulhoso tem medo de falhar, não por causa de Ti, mas por causa do que os outros diriam de mim. Perdoa, Senhor, esta minha constante fraqueza.

Não saberei Eu o que faço? Não saberei Eu como tu és e o que sentes? E, no entanto, chamo-te para o fazeres e se te chamo é porque estou contigo e te ajudo em cada um desses momentos.
Eu sei, Senhor, e depois de cada momento desses eu percebo que afinal me entreguei, me deixei conduzir, por Tua graça, claro, mas os momentos antes são tão angustiantes, Senhor.

Sabes, se não tivesses essa fraqueza, se não tivesses medo de falhar por causa dessa fraqueza, considerar-te-ias tão capaz, tão “perfeito”, que acharias não precisar de Mim, e, então sim, falharias por completo o que Eu te peço para fazer.
Reconheço isso, Senhor, e por isso mesmo me afadigo tanto na oração antes de falar, para Te pedir humildade e serviço, e que afastes de mim o orgulho e a vaidade.
Por isso Te peço, Senhor, deixa-me viver com esta fraqueza para que sempre e em todos os momentos eu perceba cada vez mais que sem Ti nada sou, nem posso.

Há fraquezas, meu filho, que ajudam a construir, que ajudam a reconhecer os limites de cada um, e, quando o próprio admite essas fraquezas, só uma coisa lhe resta, rezar e abandonar-se em Mim.
Obrigado, Senhor!



Monte Real, 31 de Março de 2022
Joaquim Mexia Alves

sábado, 26 de março de 2022

24 HORAS PARA O SENHOR

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Decorrem hoje na minha querida paróquia da Marinha Grande e em tantas outras paróquias as chamadas “24 horas para o Senhor”.

E eu fico a pensar: Só 24 horas?

E lembro-me das palavras de Jesus a Pedro e aos seus Discípulos no Getsemani: «Nem sequer pudeste vigiar uma hora comigo! Vigiai e orai, para não cairdes em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é débil.» Mt 26, 40-41

Claro que entendo que à paróquia, neste momento, seria impossível ter adoração permanente, mas nós paroquianos não o podemos fazer em permanência?

Mas não é preciso estar em frente do Santíssimo Sacramento para adorar o Senhor, para adorar a Deus.
Podemos adorar a Deus quando Lhe entregamos as nossas vidas e tudo o que fazemos em cada dia como uma oração de entrega total a Ele.
Arrisco-me a dizer que até aquilo que fazemos mal, Lhe devemos entregar em adoração, reconhecendo que pecámos, que nos afastámos Daquele que adoramos.

Ele está sempre connosco!

Por isso a nós cabe-nos acolher a Sua presença colocando-nos inteiramente nas suas mãos e dando-lhe todas os momentos das nossas vidas, bons ou maus, porque Ele na sua infinita bondade guarda no seu coração os bons momentos e, também, no seu coração perdoa os maus momentos, saídos das nossas fraquezas.

Numa oração, façamos de cada 24 horas das nossas vidas uma entrega a Deus, em adoração.


Meu Deus e meu Senhor
Conheces a minha vida e as 24 horas de cada dia que vivo por Tua graça.
Sabes bem, meu Deus, que muitas vezes não faço o bem que quero, mas faço o mal que não quero.
No entanto, meu Deus, entrego-Te todos esses momentos, numa adoração permanente a Ti, que és o Tudo no meu nada.
Adoro-Te porque só Tu és digno da minha adoração, porque só em Ti eu encontro vida, porque só em Ti eu sou Igreja, porque só em Ti eu posso amar os meus irmãos, mesmo aqueles que não me amam ou eu ainda não amo verdadeiramente.
Recebe, meu Deus, esta minha adoração, fruto da fé que me deste e que em mim ainda é mais pequena do que um grão de mostarda.
Amen.



Prostrado, como Jesus no Getsemani, apenas posso dizer: Meu Senhor e meu Deus, que seja feita sempre em tudo e em mim a Tua vontade.




Marinha Grande, 26 de Março de 2022
Joaquim Mexia Alves

quarta-feira, 16 de março de 2022

A MINHA RESSURREIÇÃO

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Fechado quase 25 anos naquele lugar sem luz, sem sentido, sem esperança, sem vida.

A minha podridão de vida era tanta que já cheirava mal e as ataduras que me ligavam, dos vícios e prazeres mundanos, tornavam o meu caminhar cada vez mais trôpego, mais vacilante, mais sem direcção, ou melhor, na direcção do abismo inexorável para que caminhava.

Tinha uma pedra enorme do meu pecado que não me deixava sair daquele túmulo em que vivia e já nada parecia restar em mim que tivesse forças ou razões para sair daquele lugar em que eu próprio me tinha colocado.

Contudo alguns dos meus, juntos em oração ao longo do tempo com outras gentes, iam chamando Jesus Cristo, ao que soube depois.

Um dia, igual a outros tantos, ouvi através da pedra que me bloqueava o caminho uma voz que dizia: “Joaquim, vem cá para fora!”

A voz foi tão imperativa e tão amorosa e terna ao mesmo tempo, que me levantei vacilante e saí para fora, pois outros se tinham encarregado de mover a pedra que não me dava saída.

Foi então que vi Jesus Cristo, que me apertou nos seus braços e disse a quem ali estava à espera da minha libertação: “Desligai-o e deixa-o andar.”

E rezaram por mim, e envolveram-me em amor, e explicaram-me tanta coisa, mas sobretudo levaram-me a perceber e a viver o amor de Deus.

E depois … depois foi entregar-me a Ele, deixar-me tocar por Ele, procurá-lo na Confissão, alimentar-me dEle na Comunhão, falar com Ele em oração, gritar por Ele quando em tribulação, agarrar a minha cruz que estava pelo chão, e viver, viver na abundância da vida que Ele me dá e que eu partilho com os outros, em comunhão.

Ah, sim, esta foi sem dúvida a minha ressurreição!!!



Monte Real, 16 de Março de 2022
Joaquim Mexia Alves

segunda-feira, 14 de março de 2022

IRMÃS CLARISSAS DE MONTE REAL

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Passam este ano 50 anos do Mosteiro de Santa Clara e do Santíssimo Sacramento de Monte Real.

Por tal facto a comunidade das Irmãs Clarissas de Monte Real vão celebrar essa data com um programa de um dia inteiro, em que, o momento mais alto será sem dúvida a Eucaristia, presidida por Dom Francisco Senra Coelho, Arcebispo de Évora, celebração em que iniciarão a Vida Religiosa 11 jovens Postulantes, através da Tomada do Hábito.

Realmente as Irmãs Clarissas chegaram a Monte Real em 5 de Março de 1965, era eu um rapaz de 16 anos, mas lembro-me perfeitamente delas, do seu ar terno, sereno e alegre, dos seus hábitos pesados, das suas sandálias mesmo no Inverno, até porque ficaram instaladas num edifício das Termas de Monte Real, cedido pelo meu pai, mesmo em frente da Capela de Santa Rita de Cássia, ali mandada construir por meu pai, também.

Estou, então, ligado às Irmãs Clarissas de Monte Real desde essa altura, embora já nelas tivesse ouvido falar aos meus pais, por causa do Mosteiro do Louriçal.

Depois foi o Mosteiro em 1972, (estava eu por terras da Guiné), e a ligação das Irmãs Clarissas à minha família, a Monte Real, continuou, embora por esse tempo já eu estivesse ausente de Deus e da Igreja, por desvios da minha vida.

Mais tarde, bastante mais tarde, já tinha eu mais de 40 anos, vim a saber por minha mãe, que ela sempre tinha pedido à comunidade das Clarissas de Monte Real para rezarem por mim, para que eu encontrasse o caminho de Deus e me deixasse tocar pelo Seu infinito amor.

E realmente, as muitas horas passadas em adoração, (24 horas por dia), daquelas muito queridas Irmãs, em que colocavam nas suas orações por todos, este pobre de Deus perdido na vida, foram ouvidas, (não ouviria Deus tamanha entrega destas mulheres que tudo deixam para O servir em adoração e oração continuamente), e eu, frágil pecador afastado de Deus, deixei-me reencontrar por Ele, deixei-me tocar por Ele, deixei-me conduzir por Ele, (nem sempre infelizmente), abracei a Igreja e fiz-me Igreja também, e, hoje, sou feliz, tenho vida e vida com sentido, e se a devo a Deus, sem dúvida, devo-a muito também às orações das Irmãs Clarissas de Monte Real e de meus pais.

A minha divida de gratidão para com as Irmãs Clarissas de Monte Real é imensa e eu sinto-a todos dias da minha vida, cada vez que abro o meu coração à oração e me deixo tocar pelo Espírito Santo, que tudo faz para me guiar apesar de todas as minhas fraquezas.

Nas minhas orações diárias, elas estão sempre presentes e eu peço a Deus que as abençoe, proteja, guarde e conserve por muitos anos, ou melhor, para sempre, porque a sua permanente adoração ao Santíssimo Sacramento e as suas perseverantes orações tornam este mundo bem melhor e repleto de esperança na misericórdia de Deus.

A paz, a ternura, o carinho, a serenidade, a alegria que se vê no rosto e na vida das Irmãs Clarissas, é um oásis no meio das desgraças do mundo, fruto de homens que não olham a Deus, mas apenas a si próprios.

Graças a Deus, temos as Irmãs Clarissas de Monte Real que olham mais a Deus e aos outros do que a si próprias.

Poderia escrever horas a fio sobre as Irmãs Clarissas de Monte Real, mas, com as minhas orações e coração, apenas lhes digo: 
Obrigado queridas Irmãs Clarissas. Deus vos abençoe sempre e vos pague em dobro a felicidade que deram à minha vida com as vossas orações.



Monte Real, 14 de Março de 2022
Joaquim Mexia Alves

Nota: “Roubei” uma fotografia ao site das Irmãs Clarissas que me parece muito sugestiva. Irmãs Clarissas de Monte Real, “anónimas” caminhando e rezando pelos outros, rezando pelo mundo.

quinta-feira, 3 de março de 2022

QUARESMA 2022

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«Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz todos os dias e siga-Me.»

Chegaram os dias da Quaresma.

Tenho escrito várias vezes que este tempo da Quaresma é um tempo que me toca particularmente.
Não me entristeço , (a não ser porque as minhas reflexões diárias me mostram sempre o meu ser pecador), mas parece-me vir uma paz de dentro de mim, que me leva a fechar os olhos, a abrir as mãos e a dizer, cheio de esperança: Aqui estou, Senhor!

Então, baixo-me para ir buscar a minha cruz ao chão, (onde tantas vezes a coloco porque me pesa), coloco-a aos ombros e caminho atrás de Ti, Senhor.
Por vezes a cruz pesa-me muito, mas é então que, como o Cireneu, Tu vens e com um terno olhar de amor, pegas também na minha cruz e ajudas-me a levá-la ao longo do caminho.

Por vezes tropeço e caio, mas Tu vens logo no Teu amor pressuroso dar-me a mão, puxar-me para cima, levantar-me para Ti.
Não me lembro, Senhor, de ver escrito que alguém Te tenha ajudado a levantar quando caíste no caminho do Calvário, mas Tu estás sempre ali, pronto para nos amparares a queda e nos ajudares a levantar.

É curioso, Senhor, que quanto mais deixo a minha cruz pesar-me nos ombros, mais a minha confiança em Ti aumenta.

Às vezes, quando caio, apetece-me ficar um pouco no chão, ali, sem nada fazer, esperando que a dor do pecado passe, mas Tu amorosamente dizes-me: Levanta-te! Caminha! A dor do pecado só se torna mais suave quando caminhas para Mim e Comigo.

E eu levanto-me, (ajudado por Ti), e dou um novo passo em frente, enquanto a cruz, como se fosse um guia, me revela que caminhos evitar, que, ironia, são sempre os mais fáceis de caminhar, mas que afinal não levam a lado nenhum.

Tomo a minha cruz e sigo-Te, Senhor!

Afinal nem é muito pesada, eu é que a carrego com tanta coisa inútil, com tantos pecados diários, que às vezes é quase insuportável de carregar.

Olhas-me, Senhor, e dizes-me cheio de bondade: Mas meu filho, a tua cruz és tu que a fazes! Eu “só” te ajudo a carregá-la!




Marinha Grande, 3 de Março de 2022
Joaquim Mexia Alves

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

RENOVAMENTO CARISMÁTICO CATÓLICO

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Passam neste mês de Fevereiro 55 anos que num retiro de fim de semana em Duquesne, na Pennsylvania, EUA, no “Centro de Retiros the Ark and the Dove”, vários jovens estudantes em oração pedindo o derramamento do Espírito Santo, foram “surpreendidos” por um “Novo Pentecostes”, (como depois lhe chamaram), que tendo transformado as suas vidas, (como transformou as dos Apóstolos naquele tempo em Jerusalém), deu início à “corrente de graça”, assim chamada pelo Cardeal Suenens, designação depois adoptada pelos Papas, comummente conhecida por Renovamento Carismático Católico.

Passam também este ano de 2022, no próximo mês de Novembro, 25 anos que, após um convite inesperado do Padre José da Lapa, meu saudoso amigo, (que trouxe o RCC para Portugal), estive presente numa Assembleia da Comunidade Pneumavita, (por ele fundada), e que foi o início da radical transformação da minha vida.

A ele, Pe José da Lapa, ao Pe António Fernandes, (também já junto de Deus), e às minhas irmãs e irmãos da Pneumavita, estou e estarei sempre profundamente grato.

Não vou contar o que se passou nesse retiro de Duquesne em 1967, mas proponho a quem quiser saber mais que adquira o livro “Como um Novo Pentecostes”, da Patti Mansfield, (edições Pneuma), que esteve presente nesse retiro e disso mesmo dá um testemunho extraordinário no livro que refiro.

Tive o prazer e sobretudo o enorme proveito de conhecer a Patti Mansfield, que fez o favor de autografar o seu livro com uma bela dedicatória.

Não vou também contar tudo o que se passou na minha vida a seguir a essa Assembleia, mas posso afirmar sem qualquer dúvida que aí se deu o meu encontro pessoal com Jesus Cristo e que esse encontro, vivo e real, (não tive nenhuma visão!), transformou por completo a minha vida, as minhas prioridades, a minha maneira incipiente, então, de rezar, e me deu a certeza de que Deus está connosco e nos ama com amor eterno.

Continuei a ter dificuldades, provações e problemas na vida, (alguns bem difíceis de ultrapassar), mas nunca me senti sozinho, pois senti sempre a presença do amor do Pai, do abraço de Jesus Cristo, da consolação serena do Espírito Santo.

Descobri uma nova relação com a Mãe de Deus e nossa Mãe, guia permanente que me diz todos os dias, “faz o que Ele te disser”, bem como um amor profundo à Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica, que é feita por homens pecadores, como eu sou.

Sou e vivo em Igreja, sempre na espiritualidade do RCC, deixando-me levar pela oração, invocando permanentemente o Espírito Santo, e tentado servir a Deus servindo os outros.

E … sou feliz!



Marinha Grande, 23 de Fevereiro de 2022
Joaquim Mexia Alves