segunda-feira, 30 de março de 2020

CONFISSÃO


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Perante Ele, os dois sozinhos, julgo eu que cara a cara, olho-O cheio de confiança e esperança.

Vamos lá então! Querias confessar-te, não era?
Ou seja, querias mostrar o teu arrependimento perante Mim de todas as fraquezas que Eu sei bem que te assolam.

Baixo a cabeça contrito, envergonhado e digo-Lhe para começar:
Obrigado, Senhor, por correres para mim e me abrires os braços do Teu amor, do Teu perdão.

Ele coloca uma mão sobre a minha cabeça, puxa-a para o Seu ombro e deixa-me falar.

Sabes, Senhor, começo pelos meus pecados de “estimação”, sabes, aqueles que repito sempre por muito que contra eles lute.
Às vezes quando menos espero percebo que já caí e digo envergonhado para mim próprio: Vigia, Joaquim, vigia! Tens de estar sempre atento.

Interrompes-me e dizes-me ao ouvido:
Fazem parte de ti, esses pecados. São tão simples e no entanto cais sempre neles. Luta sempre, porque nessa luta mostras que estás atento, vigilante, à procura da minha vontade. Perdoo-te mas não tos quero tirar, pois estarei sempre ao teu lado na luta contra eles, porque assim te lembrarás sempre que sem Mim nada podes.

Aceno com a cabeça num sim envergonhado mas cheio de esperança e começo a desfiar todos os outros pecados, alguns deles com um peso tão grande em mim.

Já acabaste, pergunta Ele?
Sim, Senhor, do que me lembro!
Pois, meu filho eu sei que há mais, mas no teu arrependimento todos eles estão contidos e assim te são perdoados como todos os outros.

A Tua bênção, Senhor, é um abraço tão forte que me sinto fundido na Tua vida e por isso mesmo me dizes com a voz repassada de amor: Agora somos novamente comunhão! Sou Eu em ti e tu em Mim!

Não sei se desfaleço de alegria, de paz ou de vida, mas sei que me sinto novo, tão novo como Deus é sempre novo.

Ele afasta-se de mim, embora permaneça em mim e ao meu lado e ainda me diz sorrindo: Quando encontrares um sacerdote meu, logo na primeira oportunidade conta-lhe o que me contaste e ele te dará a absolvição em Meu Nome.
Agora vai, e não voltes a pecar!



Marinha Grande, 30 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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sábado, 28 de março de 2020

ESTOU!


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Ao ver a imagem do Papa Francisco atravessando sozinho a Praça de São Pedro, senti-me um nada no meio de um mundo vazio.

Mas será que ele estava sozinho?
Não, não estava, pois com ele seguíamos todos nós que acreditamos e muito provavelmente até muitos que não acreditam.

Um homem de Deus nunca está só e muito menos um homem de e em Igreja.
Igreja não são paredes, portas ou janelas.
Igrejas são corações unidos em oração ao Deus que nunca falta no Seu próprio momento, no momento que só Ele sabe.

Não, o Papa Francisco não seguia sozinho!
Uma imensa multidão “igrejada” em Cristo acompanhava-o, mais do que o que o acompanhar, levantava-lhe os braços (Ex 17, 11-12) para Ele nunca esmorecer no combate que o próprio Cristo já ganhou para todos nós.

E são as nossas orações em casa, ou seja onde for, que sustentam esses braços levantados até à vitória da fé sobre a incredulidade, da confiança sobre o pessimismo, da esperança sobre o desânimo!

Deus à nossa chamada não responde “sim”, ou “quem fala”, ou “com quer falar”, responde sempre com voz forte e segura: ESTOU!

Não, a esperança não é a última que morre, apenas desaparece quando a vitória é alcançada em Deus.

Com o Papa somos um, como todos devemos ser um com o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

A Ressurreição é promessa já cumprida!


Marinha Grande, 28 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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quarta-feira, 25 de março de 2020

DEUS DE QUARENTENA!


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Deus decidiu colocar-Se de quarentena.
Não que o vírus pudesse alguma coisa contra Ele, mas quis estar com os seus, assim, confinado entre paredes.

Um Deus confinado entre paredes!
Uma impossibilidade, algo que não pode acontecer, porque Deus não cabe em lado nenhum, ou melhor, cabe em todo o lado, mas excede todas as dimensões.

Deus não quer “transmitir” o vírus e como tal torna-se omnipresente em todas as casas, lares, locais onde haja um filho seu.
É que Deus não se desloca!
Deus está!

E assim vai vivendo connosco cada momento, vendo as nossas televisões, partilhando as nossas refeições, as nossas conversas, os nossos receios e até quem sabe, as nossas discussões.
E Ele que tudo pode, vai fazendo de cada momento uma oração, uma súplica, uma acção de graças, um louvor, uma adoração.
Cada “oh meu Deus”, ou “Deus me valha”, vai directo ao seu coração e Ele abre o Seu sorriso e diz ao nosso coração: Estou aqui! Estou aqui! Não temas!

Um Deus de quarentena!!!
«Onde estiverem um ou dois em Meu nome…»
E Ele ali está de quarentena, como e com cada um de nós!

Mas precisamente por Ele estar connosco é que esta é a quarentena mais livre que existe, porque é a quarentena do sim, a quarentena da Anunciação de Maria, a quarentena do “Faça-se segundo a Tua vontade…”.

E ser livre é dizer sim, (como nos dizia Bento XVI), porque o sim constrói, une, dá vida.

Por isso a minha quarentena, a nossa quarentena é livre, é liberdade, porque é vivida no Sim a Deus, porque é vivida no «Faça-se segundo a Tua vontade».


Marinha Grande 25 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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segunda-feira, 23 de março de 2020

UMA SALA SEM PAREDES!


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Sentado na minha sala, sozinho, penso na maçada , (para não dizer mais), que é esta quarentena, que é este isolamento, apesar da família que me rodeia pela casa fora.
E quanto mais penso em mim, nestas minhas desventuras, mais parece que as paredes se vão fechando sobre mim e que o espaço me vai faltando.

Lembro-me então das palavras de Jesus que nos diz para quando orarmos, entrarmos no nosso quarto, fecharmos a porta e rezarmos ao nosso Pai em silêncio no coração.

Pois se já aqui estou, se a porta está fechada e o silêncio acontece, porque não levantar o coração ao Céu e dizer meio desconfiado, mas esperançoso: Aqui estou Pai! Faça-se a Tua vontade!

Instala-se primeiro uma paz, uma certeza, uma tranquilidade e parece que alguém se senta ao meu lado, me põe a mão no ombro e me diz para Lhe abrir o coração.
Curiosamente sinto que me diz para eu não falar de mim e dos meus problemas, mas dos outros,  daqueles que trago no coração e que me preocupam por tantas e tantas razões.

E assim começo, desfiando um mundo de lamentos pela situação deste ou daquela, pela saúde de tantos, pela solidão de muitos, pelos que sofrem, pelos que ajudam os que sofrem, por aqueles que teimosamente não querem acreditar, por aqueles que não gostam de mim, (e já agora por aqueles de quem eu também não gosto tanto), pela sociedade, pelos políticos, pela Igreja, enfim, por um mundo que não tem fim.

E Ele não me manda calar, ouve-me atentamente, diz que sim com o Seu olhar de ternura abre-me o coração e mostra-me que tudo isso e muito mais está nEle e que Ele está atento a tudo isso e muito mais.

Só então me apercebo que as paredes da sala se afastaram, que já não têm limites, (onde está Deus não há limites), e que todos aqueles por quem peço e até outros mais que não conheço, estão agora comigo, na minha sala, que entretanto tomou o espaço do mundo, do mundo divino, aquele mundo que nunca acaba e onde cabem todos os que lá queiram caber.

E Ele no meio, com um sorriso imenso diz-me ternamente: Vês como é bom estar sozinho comigo? É que onde Eu estou, estão todos os Meus que também são teus, porque a eles pertences!

Pergunto-Lhe meio envergonhado: Oh Pai porque não querias que eu falasse de mim, mas apenas dos outros?

E Ele sorri-me, com sorriso paciente cheio de misericórdia: Porque quando falas dos outros, falas também de ti e assim podes rever-te nos outros, caminhando juntos para Mim.

Fecho os olhos e deixo-me abarcar pelo mundo de Deus que é a minha sala sem paredes!



Marinha Grande, 23 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves

sábado, 21 de março de 2020

DEUS AUSENTE???


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Lembro-me muitas vezes de uma frase que o meu pároco, Pe Patrício Oliveira costuma contar de uma conversa entre um ateu e um cristão.
Perante a forma como o ateu define Deus o cristão responde-lhe com toda a simplicidade: Pois nesse deus eu também não acredito!

O Deus distante, castigador, vingativo, possessivo, que trata as suas criaturas como escravos, não é com certeza o meu Deus, não é com certeza o Pai, o Filho e o Espírito Santo revelados por Jesus Cristo.

Quando hoje em dia vejo ou ouço pessoas preocupadas, (ou até críticas), porque não há celebração da Missa, ou não se podem confessar, ou não podem comungar, por causa das regras para combater a epidemia, tenho que pensar forçosamente na história com que começo este texto.

Poderia pensar nos milhões que neste mundo acreditam em Deus mas não têm qualquer acesso a um sacerdote, a uma igreja, a uma celebração, e no entanto Deus está com eles, mas isto é tão linear que nem é quase um argumento.

Deus quis mostrar à humanidade a Sua proximidade com ela, dando o Seu próprio Filho em sacrifício na Cruz pela humanidade, por todos aqueles que queiram acreditar no Seu amor na Sua salvação.
Deixou-nos a Eucaristia, os Sacramentos, a Igreja, para nos ajudar a caminhar o Caminho, a Verdade e a Vida.
Mas não nos disse, (que eu saiba), que apenas estaria presente junto de nós e em nós desse modo, mas apenas que estaria connosco até ao fim dos tempos.

Atrevo-me a dizer que Ele está aqui ao meu lado, enquanto escrevo estas palavras e que posso recostar a minha cabeça no Seu ombro e dizer-Lhe com toda a sinceridade: Perdoa-me, Senhor, que eu sou pecador!
Posso mesmo pedir-Lhe que me deixe recebê-lO em comunhão espiritual e Ele entrega-se totalmente e faz me sentir a paz da Sua presença em mim.
E então posso adorá-lO, dar-Lhe graças, louvá-lO e pedir-Lhe o que mais necessitam aqueles que trago no meu coração e, hoje em dia, sobretudo, por esta humanidade.

Passado este período de quarentena regressarei à Eucaristia, aos Sacramentos, à Igreja e Ele responder-me-á seguramente: Aqui estou, como sempre estive contigo, mesmo quando aqui não podias vir.

Será então o tempo de fazer uma Confissão presencial, de receber o Senhor na Eucaristia, de mais uma vez e sempre me reunir em Igreja, com o Papa Francisco, com o “meu” Bispo António, com os “meus” Padres Patrício e Rui e com todos os meus irmãos na fé, numa união de amor querida por Deus, amada por Deus e que é afinal o próprio Deus de amor que está sempre connosco seja onde e como for.

Louvado seja Deus, por estes momentos mais difíceis, mas que podem ser muito ricos em amor e verdade.


Marinha Grande, 21 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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quarta-feira, 18 de março de 2020

QUARENTENA?


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Temos então quarenta dias para serem levados muito a sério.

Não interessa se me estou a referir aos quarenta dias da Quaresma ou aos quarenta dias da quarentena, porque ambos, motivados por razões diferentes, podem servir o mesmo propósito: Tempo para estar mais com Deus, em Deus e por Deus.

Mas a quarentena ajuda-nos ainda mais a pensar na fragilidade da vida e de como “não sabemos o dia nem a hora”, por isso temos de estar preparados.

Perguntamo-nos às vezes porque é que há Mosteiros de Clausura?
A resposta pode ser muito simples: Para adorar, interceder, rezar!

Estamos todos, (ou devíamos estar), em “clausura”, (embora mais “benigna” nas suas regras), por isso mesmo devemos aproveitar para adorar, interceder e rezar e assim juntar as nossas preces às preces desses Mosteiros, porque o mundo precisa, não só por causa da pandemia, mas sobretudo pelo seu afastamento progressivo de Deus, com práticas e hábitos que ofendem uma sociedade verdadeiramente humana querida por Deus.

Talvez o maior vírus não seja o tal corona, mas a indiferença, o egoísmo, a falta de moral, o abandono dos mais fracos, as crianças impedidas de nascer, os velhos e doentes obrigados a morrer, num mundo  onde pelos vistos é mais importante parecer do que ser.

Quarenta dias de oração pedindo a Deus que afaste de nós todos os vírus e que nós saibamos a partir de agora seguir os Seus Mandamentos que são a melhor profilaxia e cura para todos estes males.

Deus é amor, por isso só Deus basta!


Marinha Grande, 18 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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segunda-feira, 16 de março de 2020

FRACOS OU FORTES


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Tão fortes que nos julgamos e afinal tão fracos que somos!

Tudo o que sai das nossas mãos, das nossas capacidades, das nossas certezas, acaba por nos fazer perceber que afinal nada somos sem Ti.
Tanta discussão sobre a Ciência e a Fé para afinal percebermos, (se quisermos ser verdadeiros), que a Ciência necessita mais da Fé, do que a Fé da Ciência, embora a Fé possa necessitar também da Ciência.

Ficamos mudos, atemorizados, quase subjugados por uma coisa tão pequena como um vírus, que muito provavelmente é culpa do homem quando quer fazer de Deus.

E afinal todos nós sabemos o que é preciso para enfrentar o flagelo: «Estai preparados!
Arrependei-vos e acreditai no Evangelho.»

Não, não falo do fim do mundo, mas talvez do fim de “alguns mundos” que vamos construindo dentro de nós e dos quais afastamos Deus, por acharmos que Ele nada tem a ver com isso.

Quem se preocupa a transformar “água em vinho” numa festa de casamento, quem se preocupa em “contar os nossos cabelos”, também se preocupa com o todo que nós somos e por isso, sejam quais forem os “mundos” que criemos em nós, devemos sempre chamá-lO a construi-los connosco, ou melhor ainda, é com Ele e segundo a Sua vontade que os devemos construir.

Assim não haverá terror, medo ou subjugação, mas apenas e só amor!

E no amor, no verdadeiro amor de Deus, a vida torna-se eterna!



Marinha Grande, 16 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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quinta-feira, 12 de março de 2020

MONTANHA


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Subo ao alto da montanha, abro os braços e chamo: Senhor! Senhor! Senhor!
Só me responde o silêncio, mas eu sei que depois de todo o meu esforço em subir a montanha, Ele com certeza me responderá, pois fui ao Seu encontro.

Faço-me maior ainda, grito ainda mais alto: Senhor! Senhor! Senhor!
E nada!
Nem um sussurro, um ruído, sequer uma brisa que me toque e me faça sentir que Ele está ali.
Tento mais três ou quatro vezes e nada, nem um pequeno sinal.

Desço então a montanha, acabrunhado, triste, pensando, (pobre de mim), que teria merecido nem que fosse um pequeno sinal.

Ao chegar ao sopé da montanha vejo uma grande azáfama, com gente doente, gente com fome, gente sem abrigo, gente que chora simplesmente e no meio de todos está Ele, a trabalhar sem parança, consolando, curando, enxugando lágrimas e com Ele estão muitos também ajudando-O em todo esse trabalho.

De repente, Ele levanta os olhos, vê-me e de imediato acena-me para chegar junto dEle.

Atravesso a multidão e digo-Lhe: Aqui estou Senhor! Que queres de mim?

Olha para mim, põe-me a mão no ombro e diz-me com um sorriso: Deixa lá as tuas montanhas e vem cá para baixo, para perto de Mim, ajudares-Me a distribuir o Meu amor e o amor que eu te dei, pelos outros que mais precisam.
Assim estarás sempre perto de Mim e comigo!

Baixo a cabeça envergonhado e digo num sussurro, abraçando alguém que chora: Obrigado, Senhor!


Marinha Grande, 12 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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segunda-feira, 9 de março de 2020

O RIO DA VIDA


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Sento-me à beira do rio vendo as águas passar.

Imagino que este rio nasce do Lado Aberto de Jesus e que esta água viva que por aqui passa lava com certeza todos os meus pecados.
E assim me deixo ficar olhando as águas que correm, desejando que todas as minhas fraquezas sejam lavadas e purificadas naquelas águas.

Passa o tempo inexorável e eu vou sentindo alguma paz mas longe, mesmo muito longe de me sentir purificado, de me sentir perdoado, de me sentir envolvido totalmente na misericórdia de Deus.

É então que escuto aquela voz suave dizer-me ao coração: Entra na água, entra na corrente, deixa-te levar sem resistências. Não fiques na margem sem nada fazer. Toma a decisão e mergulha completamente na corrente da água.

Temeroso respondo: Mas, Senhor, eu não sou grande nadador! Nem sei onde me levará a corrente. Não bastarão apenas uns salpicos da Tua água para eu me sentir perdoado?

E de novo docemente me respondes: Se ficas na margem é porque estás pronto a voltar atrás, estás pronto a sair de perto desta água viva e assim a tua vontade de arrependimento é pouca.

Não, Senhor, respondo eu, quero ser perdoado, quero arrepender-me, quero não voltar a pecar, mas a corrente é tão impetuosa!

É então que me estendes a mão, (como estendeste a Pedro), e me seguras até eu entrar totalmente na água e deixar-me levar pela corrente.

Ao princípio parece que me vou afogar pois a água entra em golfadas pela minha boca e não me deixa respirar, mas lentamente e inexoravelmente a Tua água torna-se no meu respirar e eu sinto-me amado, perdoado, acarinhado, envolto numa paz inexplicável.

Dizes-me ainda com voz forte e amorosa: Cuidado que há escolhos na corrente, mas se te mantiveres mergulhado totalmente na Minha água, a torrente do Meu amor far-te-á ultrapassar e vencer todas essas dificuldades.

Vem-me então ao pensamento uma ideia que me faz sorrir: Ainda bem que não sei nadar, porque assim são os Teus braços que me sustentam e me levam no rio da minha vida!



Marinha Grande, 9 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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sexta-feira, 6 de março de 2020

A BARCA DA MINHA VIDA


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Fecho os olhos e deixo-me levar!

A barca da minha vida já há muito tempo partiu, mas só agora, (o que é agora se pensar em eternidade?), me dou conta de que inúmeras vezes ninguém comandou esta barca, ou melhor, fui eu, que não sou ninguém, quem a comandou, e por isso tantas vezes fui ter a portos inseguros, a tempestades horríveis, tantas vezes fui atingido por ventos que dividem, navegando sem rumo, sem direcção, sem sentido.

Um dia entraste na minha barca e calmamente tomaste o leme e navegaste por mares calmos, mas também atravessaste ondas alterosas, abismos profundos, monstros inenarráveis, mas sempre com o Teu sorriso terno, olhavas para mim e dizias  com a voz repassada de amor: Não temas Eu estou aqui!

Mas quantas vezes, apesar de dizer com a boca que confiava em Ti, eu tirei o leme das Tuas mãos e me pus a navegar, precipitando-me sempre em perigos constantes, até reconhecer que só Tu sabes conduzir a minha barca e então gritava-Te, cheio de medo: Salva-me, Senhor!

E, no entanto, este passado torna-se todos os dias presente: Tu a quereres-me salvar e eu a querer-me convencer de que já me salvei!

Já mudei tantas coisas!
Já me libertei de tanto lixo!
Já abandonei tanta ideia errada!
E, mesmo assim, continuo sem saber navegar, ou melhor, sou inconstante na navegação!

Diz-me, Senhor, porque não consigo eu libertar-me de mim próprio, para vazio de tudo ser quem Tu queres que eu seja?

Pacientemente, como sempre, tomas o leme novamente e dizes-me cheio de compaixão: Mas ainda não percebeste que Eu te amo como tu és? Ainda não percebeste que cada vez que Me tiras o leme da tua barca, Eu fico ao teu lado até Tu reconheceres que estás a navegar sem rumo? Ainda não percebeste que toda essa luta diária és tu a fazer o que Eu quero, ou seja, a tentares viver segundo a minha vontade?
Repousa agora por um pouco de tempo que Eu vou-te levando a porto seguro!

Recosto-me na proa da minha vida e adormeço a cantar baixinho: Eu me rendo, eu me rendo, eu me rendo….


Marinha Grande, 6 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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terça-feira, 3 de março de 2020

PROCURO UM DESERTO


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Procuro um deserto para a minha quaresma!
Mas o inimigo em vez me tentar no deserto, tenta-me antes a querer fugir do deserto!

Pois é, se me deixar envolver nas minhas coisas, nos meus problemas, na minha saúde periclitante, deixo de ter tempo para entrar no deserto que me livra de tudo isto e me coloca perante mim, e mais do que perante mim, perante Deus.

E eu preciso de me colocar perante Deus!
Preciso olhá-Lo nos olhos, estender-Lhe a mão, (como um qualquer Pedro a afundar), dizer-Lhe ao ouvido ou mesmo gritar-Lhe em voz alta: Senhor que queres que eu faça?

Ah, mas preciso também de estar nesse deserto, liberto dos restos de mim, para ouvir a Sua voz no meu coração dizer-me: Converte-te e acredita no Evangelho!

E eu lá responderei mais ou menos convicto, de que sim, que acredito no Evangelho e Ele lá me responderá cheio de paciência e amor que acreditar no Evangelho é vivê-Lo inteiramente sobretudo naquilo que me é mais difícil.

E eu hei-de perguntar-Lhe, cheio de esperteza humana: E, Senhor, o que será o mais difícil para mim?
E Ele há-de responder-me, com um sorriso de imensa ternura: Precisamente aquilo que não queres mudar em ti!



Marinha Grande, 3 de Março de 2020
Joaquim Mexia Alves
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