quarta-feira, 6 de julho de 2022

O ELOGIO DA VELHICE

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Deus concedeu-me a graça de ter 4 filhos.

Acredito que cada um deles me há-de pegar pela mão e ajudar a atravessar a estrada que se vai agora apresentando à minha vida .

Agora ainda acham graça às minhas expressões de dor que vai percorrendo todo o meu corpo mas sei e sinto que lá no fundo se vão preocupando com o pai que continua, apesar de tudo, forte e vivo.

Claro que as dores são fruto da idade, mas também muito fruto das asneiras da vida que levei e que foram muitas, (algumas forçadas, como a guerra, mas a maior parte de livre vontade), e tinham forçosamente de marcar os meus anos mais velhos

Um tal Variações cantava que “quando a cabeça não tem juízo o corpo é que paga”!

É engraçado começar a viver agora as recordações daquilo que, quando novo, achava daqueles que tendo a minha idade ou sendo mais velhos, iam dizendo e se iam queixando e como eu desvalorizava esses “queixumes” acreditando que eram para chamar a atenção.

Percebo agora que os nossos “queixumes” nestas idades, são muito mais para nós, são íntimos, do que para chamar a atenção dos outros.

Gostaríamos até de conseguir não nos queixarmos para não preocuparmos os mais novos, mas, caramba, às vezes nem são tanto as dores, são mais as incapacidades de fazer algo tão simples como calçar e descalçar as meias sem ter que “gemer” um pouco!

Mas é bom ser mais velho.

Dá-nos, por exemplo, a capacidade de nos calarmos para não provocar discussões, (embora tenhamos os nossos “repentes” pois claro), conseguirmos “adivinhar” reações, sabermos coisas que os mais novos ficam espantados, contarmos histórias que eles querem ouvir, (às vezes até lhes acrescentamos umas “coisas” para ficarem mais bonitas ou interessantes), lembrarmos sítios que já não existem ou tradições perdidas, enfim, somos quase uma “enciclopédia” de “banalidades” interessantes.

E é tão gratificante quando os mais novos nos pedem para repetir as histórias que já contámos vezes sem fim, mas que eles querem recordar, muito provavelmente para poderem contar quando chegarem à “idade das dores”.

Depois, também, as ofensas que nos fizeram ou nós fizemos, vão-se esbatendo e vamos percebendo o ridículo do incómodo que nos causamos por não perdoar ou não pedir perdão.
Começamos a perceber bem melhor o sentido de viver em paz.

A mim, sinceramente, nunca me preocupou a idade, (a não ser por causa das tais “incapacidades”), e acho até interessante ser olhado como mais velho.
Há sempre algum respeito nesses olhares.

A morte nunca me preocupou e hoje em dia muito menos, pois a Fé que vivo ou tento viver todos os dias, dá-me a certeza de que, mais tarde ou mais cedo, estarei nos braços de Deus, (depois de purificadas as minhas inúmeras faltas), no gozo do amor que nunca acaba.

E o amor talvez seja o melhor elogio à velhice!



Monte Real, 6 de Julho de 2022
Joaquim Mexia Alves


Nota: Claro que escrevo o que sinto e na generalidade, pois cada situação é diferente, sobretudo para aqueles que são abandonados pelos mais novos.

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