quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

ERA NOITE DE NATAL!

Era noite de Natal!
Estava ali sozinho na sala, sentado no sofá, envolto nos seus pensamentos.
Tinha visto ao longo dos últimos dias as pessoas na rua com um comportamento diferente, um modo de se olharem mais próximo, uns sorrisos que ao longo do ano não se costumavam ver, uma correria para as últimas compras, enfim uma maneira diversa de se relacionarem, mesmo entre aqueles que não se conheciam.
Na sua casa no entanto nada mudava, tudo ficava igual, e era assim que ele queria fosse!
Vivia sozinho e não gostava do Natal!
Aquela coisa da festa da família não lhe dizia nada, pois há muito que vivia só, sem família.
Lembrou-se de quando tinha família e logo uma irritação lhe despontou no seu coração.
A sua mulher tinha morrido há muito tempo e aquele filho único...
Agitou-se no sofá.
Aquele filho único, aquela discussão, aquela zanga, aquele cortar de relações.
Já nem se lembrava bem do que tinha dado origem a tudo aquilo, mas lembrava-se das palavras que ele lhe tinha dito e o tinham magoado, tinham ferido, tinham rasgado tão profundamente os sentimentos, que tinha ouvido distintamente a voz do seu filho dizer: Eu já não tenho pai!
Lembrava-se também de gelidamente nada ter feito para impedir a sua saída de casa.
Tinha-o deixado sozinho naquele momento tão difícil para ele.
Nunca lhe perdoaria!
Não queria saber o que era feito dele, não lhe interessava, embora por vezes viesse ao seu coração um sentimento que não sabia explicar, como que de saudades, o que era de todo impossível porque para ele aquele filho era como se não existisse.
Pôs de lado os seus pensamentos. Não valiam a pena.
Preparou-se para cear qualquer coisa, fazendo essa pequena concessão ao espírito de Natal.
Quando se levantava do sofá, ouviu um carro parar à porta de casa e o bater de uma porta.
Movido pela curiosidade aproximou-se da janela e espreitou para a rua.
O seu coração gelou!
A abrir a cancela do jardim estava o seu filho, com um embrulho nas suas mãos e um grande sorriso na cara.
Ainda hoje não sabe explicar o que aconteceu, mas a verdade é que num instante se encontrou na rua e abraçado àquele corpo, chorava convulsivamente.
O filho empurrando-o gentilmente, afastou-o um pouco e disse-lhe com voz embargada:
Perdoa-me pai, perdoa-me, porque te magoei, porque me afastei de ti, porque não fui bom filho.
Mas ele não tinha palavras, apenas o queria abraçar, apenas o queria sentir junto de si, apenas queria sentir apertado em si, dentro de si, aquela “carne da sua carne”.
No entanto, afastando-se um pouco, olhou-o profundamente nos olhos e disse-lhe:
Perdoar o quê meu filho, (que bem lhe soube aquela palavra, filho), perdoar o quê? Entra, entra, vem para dentro, deixa-me ver-te, deixa-me sentir-te, deixa-me abraçar-te.
Entraram em casa abraçados um ao outro, felizes como duas crianças em dia de aniversário e sentaram-se frente a frente no sofá.
Olhou o seu filho no fundo dos olhos e disse-lhe pesaroso:
Mas eu não tenho nada para festejar! Nem bons vinhos, nem “vitelo gordo”, nem convidados para se alegrarem connosco!
Então o filho suavemente pegou-lhe nas mãos e colocando-as no meio das suas disse-lhe numa voz repassada de amor:
A festa neste momento somos nós meu pai. Porque eu andava perdido, a vida sem ti não tinha sentido, e tu mal me viste correste para mim e me abraçaste. A festa neste momento somos nós, meu pai, porque agora junto a ti, renascemos para o amor.
Ficaram ali, sentados no sofá, olhando-se nos olhos, mãos nas mãos, sem palavras, apenas vivendo-se um ao outro.
No meio deles, sem se ver mas presente, muito presente, (onde está o amor, Ele está sempre presente), estava Jesus Menino, que sorria com um sorriso que fazia empalidecer as estrelas.
Era noite de Natal!
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Monte Real, 20 de Dezembro de 2007

21 comentários:

C.M. disse...

Joaquim... são 10H58 desta manhã de sexta-feira, estou aqui nesta cidade de Lisboa, no meu gabinete de trabalho, atafulhado de processos, de preocupações e... lembrei-me de, por uns instantes, fazer uma pausa para o café, que tenho em cima da minha mesa, e ver os blogs dos amigos; um deles é o seu.

Devia "castigá-lo" Joaquim, por me ter feito chorar. Chorar a valer nos meus 50's anos, véspera de fazer 52... O seu texto é tão belo tão belo, tão cheio de beleza dramática e de poesia, que vou imprimi-lo, e vou guardá-lo religiosamente dentro de um livro de leitura frequente… talvez os sermões de Santo António…

Como para mim é dramático este seu texto!

Quem me dera que a cena que descreveu pudesse hoje acontecer!

Vou um dia partir com esta mágoa…

Não me vou alongar…

Abraço forte, Joaquim, e um Santo Natal, na companhia daqueles que mais ama!

C.M. disse...

Em tempo: bela música esta que colocou aqui... também sou um incondicional da Enya...

Fá menor disse...

Porque é que tens o condão de me fazer chorar?...

Eu sei que tenho a sensibilidade à flor da pele, que choro por tudo e por nada... mas agora... foi comovente de mais, Joaquim!

Às vezes bastaria tão pouco esforço para uma reconciliação... e muitas vezes ninguém quer dar o primeiro passo e um Natal deixa de acontecer!

Que muita gente possa ter um Natal feliz como há muito tempo não tem!

Óptimo Natal para ti e para todos os que te são queridos, meu amigo!

Um abraço te deixo, em Cristo Menino.

Fa-

antonio disse...

Muitas das vezes escutamos as palavras, quando deviamos de escutar o coração. No coração daquele filho, o pai nunca chegou a estar verdadeiramente ausente.

joaquim disse...

Amigo Cabral-Mendes, as suas palavras tocaram-me no fundo do coração.
Tenho para mim que as lágrimas derramadas perante o perdão, a reconciliação, são lágrimas de amor, lágrimas de alegria, lágrimas de paz.
E eu gosto de as chorar apesar dos meus quase 60's, porque sei, porque sinto no Senhor que há sempre tempo para perdoar e ser perdoado.
Do fundo do coração rezo para que nnunca se torne realidade aquilo que me diz no seu comentário:
«Vou um dia partir com esta mágoa…»
Obrigado pela sua amizade!
Um Santo Natal para si, todos os seus e mesmo aqueles que não estão junto a si...
Abraço forte e amigo em Cristo

joaquim disse...

Oh Fa, eu não te faço chorar!
Tu choras porque és sensivel e tens o coração aberto às coisas simples, às coisas de Deus.
Deixo-te um segredo, não contes a ninguém.
Eu também choro muitas vezes quando escrevo estas histórias que Ele coloca no meu coração.
Ah, e gosto de chorar, porque me acalma, me dá paz e me diz que eu estou vivo e sinto!
Que esta história possa ser realidade em muitas familias separadas.
Um Santo Natal para ti e todos os teus, e os que te rodeiam e todos, todos...
Abraço forte e amigo em Cristo

joaquim disse...

Meu caro António,
É verdade, muitas vezes deixamo-nos levar pela cabeça, quando deviamos seguir o coração.
Como no coração do pai o filho nunca esteve verdadeiramente ausente.
Sabes, acredito que estas histórias que me são inspiradas se tornam realidade em alguém, nalgum tempo e algum espaço.
Um Santo Natal para ti, para os teus, para os que te rodeiam...
Abraço forte e amigo em Cristo

Sandra Dantas disse...

Amigo Joaquim,
nem sabes em quantas coisas me fizeste pensar, quantos sentimentos afloraram ao ler esta história... Talvez um dia te explique porquê... Agora faltam-me as palavras!

Um Santo Natal para ti e todos os teus!

Um grandioso abraço amigo!

José Avlis disse...

* * * * *

Caro Irmão e Amigo Joaquim

Desculpa não participar mais frequentemente no teu blogue, mas a efectiva falta de tempo, de condições e de organização, constitui uma séria limitação, com grande desgosto meu, como creio que compreendes.

De tal modo que, mesmo em relação ao blogue que dirijo, assim como relativamente à minha própria familia, tantas vezes falho, até porque considero-me muito imperfeito, o que no entanto tento aceitar humildemente, em desconto dos meus pecados.
Aliás, todos nós temos os nossos espinhos, os nossos escolhos, ainda que não pareça...

Mudando de assunto:
Também apreciei muito esta tua história, em particular, que igualmente comoveu-me deveras...
A propósito, é real ou fictícia?
De qualquer modo, qual parábola do Filho Pródigo (aliás baseada mesmo nela), o mais importante é o sentido cem por cento cristão e natalício...
Parabéns, por tê-la publicado, e pelos vistos com bastantes frutos afectivos e espirituais, graças a Deus!

A propósito, pensei em publicá-la também no blogue da minha gerência (o N.E.C.), oportunamente...
Espero que não te importes, mas se te fizer diferença diz alguma coisa.

Finalmente - como não podia deixar de ser (desculpa deixar para o fim) -, faço os melhores votos para que tenhas, um FELIZ E SANTO NATAL, assim como a tua família e amigos, e mais quem quiseres associar, não esquecendo os leitores e colaboradores deste teu excelente blogue!
Na Paz, na Alegria e no Amor de Cristo nosso Senhor!
Em resumo, na santa companhia da Sagrada Família de Nazaré: Jesus, Maria e José!

+ Glória a Deus nas Alturas e Paz na Terra aos Homens por Ele amados!

José Mariano

* * * * *

Elsa Sequeira disse...

Olá!!

Faz tempo que não aparecia, mas hoje tive que deixar tudo e vir até cá! Vimn trazer-te todo o meu carinho e amor envoltos em paz!
Desejo-te um Natal maravilhoso junto de todos os teus familiares e amigos!!!
Beijinhos!!!

sedente disse...

Um santo Natal para ti e para todos aqueles que guardas no coração.
Que o Deus feito menino, adorado por Maria e José, nos abençoe a todos.
Abrç+

Anónimo disse...

Joaquim,
nesta noite gostaria de te dar mais do que nos outros dias, mas não sei que possa servir-te, à tua medida!
Por isso, fica o abraço para todos os tamanhos.
E os votos de Santo Natal e Bom Ano 2008. Th.M.

joaquim disse...

Amiga Sandra
obrigado pelas tuas palavras.
Estarei sempre à tua disposição...
É tão bom o perdão...
Peço-te desculpa por ter sustentado no teu espaço uma "discussão", que afinal, a meu ver, não tinha "utilidade".
Um abraço forte e amigo em Cristo

joaquim disse...

Caro amigo José Mariano
Obrigado pela visita!
Realmente o nosso tempo nunca chega para tudo aquilo que gostávamos de fazer!
Quanto ao texto, como já uma vez te disse tudo o que aqui escrevo está à tua disposição, tanto mais que depois do teu convite me sinto colaborador do N. E. embora com pouco tempo para colaborar.
Um Ano Novo cheio das graças do Senhor é o que te desejo do coração e a todos os teus.
Abraço forte e amigo em Cristo

joaquim disse...

Olá Elsa!
Sempre presente!
Já deixei também uma mensagem no teu cantinho!
Obrigado!
Abreijos amigos em Cristo

joaquim disse...

caro amigo sedente

Silencioso e presente amigo que sempre visito com lucro!

Obrigado com um abraço forte e amigo em Cristo

joaquim disse...

caro Thiago

Obrigado pela visita!
Já te respondi à mensagem que me tocou, por outra via.
Um abraço igual ao teu em Cristo

Anónimo disse...

Querido amigo Joaquim,

Este conto tocou-me profundamente e ficou difícil comentar.
Obrigada por isso e segue um forte abraço em Cristo.

J disse...

Joaquim,

Adorei o seu conto de Natal, é de cortar a respiração,tão simples tão tocante, com Cristo tão presente, obrigado obrigado obrigado.

Estou sem palavras!

Um grande beijinho em Cristo

joaquim disse...

Obrigado Malu

Eu sei!
O conto é mais para viver que comentar, mas é bom sabermos que afinal aquilo que escrevemos não foi só para nós, mas também serviu aos outros.
Abreijo amigo em Cristo

joaquim disse...

Joana, já em cima expressei aminha alegria de te ver por aqui!
É verdade, porque é nas coisas simples que Ele se revela, como nos teus contos dos quais temos saudades.
Abrajinho amigo em Cristo