sexta-feira, 16 de novembro de 2012

"CREIO NO ESPÍRITO SANTO" (1)

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A propósito do tema de hoje, "Creio no Espírito Santo", lembrei-me de uma graça que ouvi contar há uns anos, e que tem a ver com a Sua presença na Igreja e em nós, claro.
 
Havia um pároco já de idade avançada numa determinada paróquia e percebia-se que o cansaço estava a tomar conta dele porque cada vez mais diminuía o número de fiéis na Missa Dominical.
O Bispo dessa Diocese, decidiu então dar-lhe o merecido descanso, e colocou no seu lugar um jovem sacerdote, cheio de genica e vontade de trabalhar.
Passado pouco tempo já a igreja estava cheia de fiéis na Missa Dominical.
Num Domingo o Bispo decidiu ir à paróquia fazer uma visita e reparou com agrado que a igreja estava cheia.
Já na sacristia, depois da Missa, reparou no olhar orgulhoso do novo pároco, por causa do número de pessoas presentes na Missa.
O Bispo decidiu então chamá-lo à razão e disse-lhe:
Senhor Padre, não se orgulhe muito, porque tudo isto é trabalho do Espírito Santo!
Ao que o jovem sacerdote respondeu, com um sorriso:
Pois, pois, mas o Espírito Santo já cá estava antes de eu cá chegar!
 
Esta graça, que não tem qualquer maldade, poderá servir-nos daqui a pouco para percebermos a acção do Espírito Santo em nós e na Igreja, mas por agora detenhamo-nos no tema que nos foi dado: Creio no Espírito Santo!
 
Muito melhor do que quaisquer palavras que eu diga, o Catecismo da Igreja Católica explica verdadeiramente e sem a mínima dúvida o que é crer no Espírito Santo.
 
685. Crer no Espírito é, professar que o Espírito Santo é uma das Pessoas da Santíssima Trindade, consubstancial ao Pai e ao Filho, «adorado e glorificado com o Pai e o Filho.»
 
Esta é uma verdade que todos conhecemos e repetimos todos os dias, sobretudo quando nos benzemos em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
 
E no entanto o Espírito Santo parece-nos muitas vezes um “ilustre desconhecido”, se me permitem esta expressão.
 
Já não tanto como quando eu era novo, tempo em que por exemplo os protestantes criticavam os católicos por “desconhecerem” o Espírito Santo, ou como alguns deles diziam, O termos substituído pela Virgem Maria.
Talvez tivessem alguma razão, nesse tempo!
 
Obviamente que a Igreja, a Tradição, o seu Magistério, sempre falou e ensinou sobre o Espírito Santo e é conhecida, por exemplo, a Carta Encíclica do Papa Leão XIII, Divinum Illud Munus, sobre a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade.
 
No entanto, é o Papa João XXIII, que na Constituição Apostólica Humanae Salutis Convocatória do Concílio Ecuménico Vaticano II, vai tornar actual, perdoem-me a expressão, o Espírito Santo!
 
Cito:
«E digne-se o divino Espírito ouvir da maneira mais consoladora a oração que todos os dias sobe de todos os recantos da terra: "Renova em nossa época os prodígios, como em novo Pentecostes; e concede que a Igreja santa, reunida em unânime e instante oração junto a Maria, Mãe de Jesus, e guiada por Pedro, difunda o reino do divino Salvador, que é reino da verdade, de justiça, de amor e de paz. Assim seja"» Humanae Salutis
 
E fora ouvidas as palavras do Beato Papa, porque o Concílio Vaticano II veio trazer um novo folego à Igreja, na construção de uma Igreja mais próxima dos fiéis, de tal modo que fez surgir diversíssimos Movimentos e Obras, a maior parte fundados por leigos em companhia de sacerdotes, numa diversidade rica de espiritualidade, em união e comunhão de Igreja, abarcando todos os sectores da sociedade humana à procura de Deus.
 
Com efeito o Espírito Santo não é de ontem, não é das primeiras comunidades cristãs, nem apenas dos primeiros Padres, o Espírito Santo é de ontem, de hoje e para sempre.
 
Sem Ele não há fé!
 
Atentemos no que nos diz o Catecismo da Igreja Católica, no item 683:
 
683. «Ninguém pode dizer "Jesus é o Senhor" a não ser pela acção do Espírito Santo» (1Cor 12, 3). «Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: "Abbá! Pai!'» (Gl 4, 6). Este conhecimento da fé só é possível no Espírito Santo. Para estar em contacto com Cristo, é preciso primeiro ter sido tocado pelo Espírito Santo. É Ele que nos precede e suscita em nós a fé. Em virtude do nosso Baptismo, primeiro sacramento da fé, a Vida, que tem a sua fonte no Pai e nos é oferecida no Filho, é-nos comunicada, íntima e pessoalmente, pelo Espírito Santo na Igreja.
 
E depois o Catecismo cita Santo Ireneu
 
O Baptismo «dá-nos a graça do novo nascimento em Deus Pai, por meio do Filho no Espírito Santo. Porque aqueles que têm o Espírito de Deus são conduzidos ao Verbo, isto é, ao Filho: mas o Filho apresenta-os ao Pai, e o Pai dá-lhes a incorruptibilidade. Portanto, sem o Espírito não é possível ver o Filho de Deus, e sem o Filho ninguém tem acesso ao Pai, porque o conhecimento do Pai é o Filho, e o conhecimento do Filho de Deus faz-se pelo Espírito Santo».
 
E ainda nesta citação, no item 684:
684. O Espírito Santo, pela sua graça, é o primeiro no despertar da nossa fé e na vida nova que consiste em conhecer o Pai e Aquele que Ele enviou, Jesus Cristo
 
Em palavras muito simples poderemos dizer que o Antigo Testamento nos revela o Pai, o Criador, e de forma mais velada, (passe a expressão), o Filho que há-de vir.
O Novo Testamento, sobretudo nos Evangelhos, manifesta o Filho, a Revelação do Deus que se quis dar a conhecer aos homens para sua salvação.
Nos Actos dos Apóstolos poderemos dizer que nos é revelado o Espírito Santo, prometido pelo Filho, que como o próprio Jesus Cristo nos diz, nos fará reconhecer a Verdade e guiará no caminho da salvação:
 
«Tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas não sois capazes de as compreender por agora. Quando Ele vier, o Espírito da Verdade, há-de guiar-vos para a Verdade completa. Ele não falará por si próprio, mas há-de dar-vos a conhecer quanto ouvir e anunciar-vos o que há-de vir.» Jo 16, 12-13
 
 
 
Nota:
"Palestra" que fiz na Escola Vicarial da Fé, (Vigararia da Marinha Grande), e que aqui divido em várias partes dada a sua extensão.
Este texto é obviamente um guia para uma intervenção oral que foi desenvolvendo o tema.
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sexta-feira, 9 de novembro de 2012

CAMINHO DE CONVERSÃO 19

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Segunda-feira, 8 de Março de 2004
 
Obrigado, Senhor, por mais este dia e por tudo quanto me deste.
A adoração à hora do almoço, a vigília da paz à noite. Obrigado Senhor!
 
Obrigado, Senhor, pelo Teu infinito perdão: tantos pecados, tantas fraquezas e Tu, Senhor, sempre pronto a perdoar.
 
Porque não chora o meu coração, Senhor?
Ofendo-Te tanto com a minha “insinceridade”, com a minha oração apressada, com o meu orgulho, a minha vaidade, o meu ciúme e inveja, com a minha maneira de ser interesseira, e Tu tudo perdoas. Mas eu não sinto a dor, a vergonha de Te ter ofendido!
 
Preciso, Senhor, do dom da contrição, preciso, Senhor, de em todos os momentos em que Te ofender, sentir o meu coração chorar de dor, de vergonha, por ofender Aquele que tudo deu por mim.
 
Preciso, Senhor, de sentir que cada fraqueza minha, que cada pecado meu, é mais um espinho na Tua cabeça, uma vergastada nas Tuas costas, um insulto na Tua face, uma martelada nos cravos nas Tuas mãos.
Preciso, Senhor, sentir que Te magoo, que Te ofendo, para que na dor de o sentir, de o perceber, eu ter mais forças para lutar, mais compromisso com a santidade.
Não para minha glória ou satisfação, mas para não Te magoar, não Te ofender.
 
Que o Teu olhar me envolva, Senhor, que os Teus braços me apertem, que o Teu coração também bata no meu, para que eu possa viver um pouco, apenas um pouco, da Tua Paixão, e assim aumentar muito mais o meu amor por Ti, Deus de bondade que Te entregaste por mim.
 
Quero sentir, Senhor, tudo isso, se for de Tua vontade, porque eu não sou digno sequer de sentir o que o meu Senhor sentiu.
 
Mãe, ajuda-me neste caminho!
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terça-feira, 6 de novembro de 2012

CAMINHO DE CONVERSÃO 18

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Domingo, 8 de Fevereiro de 2004
 
Obrigado, Senhor, por mais este dia, por mais este Domingo em que não tendo pensado em Ti tanto como queria e devia, sei que Tu sempre me tiveste no Teu coração, no Teu amor. Obrigado Deus de bondade infinita.
 
Obrigado, Senhor, porque hoje nas Vésperas me deste a ler e meditar esta frase de Santo Agostinho: «Sabei que também vós, que renunciaste a este mundo saístes do Egipto.»
 
Com efeito, Senhor, aquele povo, ouvindo a Tua voz, abandonou o mundo em que vivia, e que apesar de todas as dores e humilhações era, aos olhos humanos, um mundo seguro, uma vida estável, para se lançar na “aventura” de Te seguir, de fazer a Tua vontade, procurando-Te incessantemente.
Tantos anos de tribulações, de provações, de adversidades, de medos, de fraquezas, de pecados, até de Te renegar, Senhor, e Tu nunca lhes faltaste com nada do que eles verdadeiramente precisavam.
 
Assim é, Senhor, quando decidimos seguir-Te na nossa vida, abandonando as “certezas” do mundo, para aceitarmos a Tua vontade, confiando e esperando, temos a certeza de que Tu nunca nos abandonas.
 
Não é uma vida fácil e sem tropeços, mas acreditamos que Tu nunca nos faltas com aquilo que verdadeiramente precisamos, e que nos momentos difíceis ali estás, para nos matar a sede e nos alimentares as forças que nos vão faltando.
Sabemos que, apesar de fracos como somos nos afastarmos de Ti tantas vezes, Tu não nos abandonas e permaneces fiel ao nosso lado e em nós.
 
Glória a Ti, Senhor, Deus de bondade infinita.
Eu creio em Ti, eu confio em Ti, eu espero em Ti, Senhor!

 
 
 
Nota:
 
Regresso hoje aos textos que, ao longo de um tempo particularmente dificil da minha vida, fui escrevendo como caminho de conversão á procura de Deus.
Aqui copio a nota que em 18 de Fevereiro de 2009, coloquei no primeiro texto, como explicação do mesmo.
 
«Inicio assim a transcrição o mais fiel possível de alguns escritos que naquele tempo praticamente todas as noites, escrevia como reflexão.
Não o faço com outro intuito que não seja dar a conhecer um caminho de conversão que poderá ajudar alguém a caminhar a sua própria conversão.
Não teve um programa preestabelecido, mas foi uma necessidade que senti diariamente de escrever para melhor me confrontar com a minha vida e com aquilo que Deus ia colocando no meu coração.
São de um modo geral coisas muito simples que todos conhecem, mas que às vezes esquecemos, complicando o que é simples.
«Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu.» Mt 18,3
«Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como um pequenino, não entrará nele.» Lc 18,17


Coloco estes escritos nas mãos de Deus para que servindo-O possam servir aquelas e aqueles que os lerem.»

Os textos anteriores, podem ser encontrados na etiqueta "Caminho de Conversão", na barra lateral.
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terça-feira, 30 de outubro de 2012

A FÉ II

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Ouvimos por aí a muita gente frases deste tipo:
Eu tenho muita fé que Deus me vai dar o que eu lhe peço!
 
Quer dizer então que aquela “fé” se baseia em Deus dar aquilo que alguém Lhe pede, segundo a vontade, segundo os planos daquele que pede.
O que significa também, que se tal pedido não for concedido, a “fé” deixa de existir, porque ela se firma na obtenção do que se pede, e não na “capacidade” de Deus conhecer o que é melhor para aquele que pede, e, sabendo que a satisfação desse pedido não serve ao impetrante, não satisfazer tal pedido.
 
Tenhamos em conta a mesma frase, mas proferida de outro modo:
Eu tenho fé em Deus, e acredito que Ele me concederá o que Lhe peço, se for de Sua vontade.
 
Poder-se-á dizer que é uma questão de semântica, mas na realidade vai muito mais longe do que a semântica, pois revela posturas completamente diferentes perante Deus e perante a fé em Deus.
 
Se a minha “fé” se baseia naquilo que Deus me dá ou pode dar, então a minha “fé” é uma espécie de “comércio”, ou seja, Deus dá-me o que eu peço e eu acredito n’Ele, ou então, se não me dá, é vã a minha “fé”, ou seja, a minha “fé” deixa de existir porque não tem sentido, visto que aquilo em que acreditava não aconteceu.
 
Esta “fé” nada tem de transcendente, nada tem de dom de Deus, porque se firma apenas nas coisas materiais, palpáveis, que eu posso dominar e das quais me posso servir a meu belo prazer.
Esta “fé” é uma relação que se autodestrói, porque se fixa apenas naquilo que posso obter daquele em que acredito, e não no todo que Ele é, e como tal, falhado o objectivo da “fé” por não obter o que pretendo, falha também o acreditar n’Aquele que é “objecto” da “fé”.
 
Então, se a minha “fé” é esta acima descrita, toda a confiança e esperança colocada naquele de quem quero obter o que pretendo, morre, ao não me ser concedido o que pretendo, e a minha vida, que vivia dessa relação assente numa “fé parcial”, torna-se desesperada porque já não tem nada em que acreditar, em que confiar, em que esperar.
 
A Fé, dom de Deus, não se ocupa do que pode obter do próprio Deus, mas sim, ocupa-se em acreditar e viver esse acreditar em Deus Revelado aos homens, porque sabe também que tudo o que realmente precisa e é bom para a sua vida, lhe virá por acréscimo, por força da confiança e da esperança no Deus a Quem nada é impossível e tudo conhece.
 
Porque a Fé ilumina o pedido, (peço segundo a vontade de Deus), e iluminando o pedido, ilumina a aceitação da resposta de Deus, mesmo que ela não seja conforme os meus desejos, porque faz nascer no meu coração a certeza de que, se tal não me foi concedido, é porque não era o melhor para a minha vida e, assim, Deus que me ama com amor infinito, cuidou de me proteger do que me podia fazer mal.
 
E esta Fé, (a única e verdadeira Fé), leva-me a uma relação tão única, pessoal e intima com Deus, que, mesmo nos momentos mais difíceis, mesmo nos momentos em que nada me é concedido, mesmo nos momentos em que Deus parece muito longe, a aceitação de tudo é uma constante certeza de fazer a vontade de Deus, (E dizia: «Abbá, Pai, tudo te é possível; afasta de mim este cálice! Mas não se faça o que Eu quero, e sim o que Tu queres.» Mc 14,36), e assim sendo, saber intimamente que Ele nunca me abandona.
Por isso mesmo esses momentos não são nunca um fim, mas um eterno recomeço na procura da Sua vontade.
Por isso a confiança e a esperança não morrem, mas são sempre vivas, porque Ele faz novas todas as coisas, («Eu renovo todas as coisas.»Ap 21,5), e se são sempre novas, também a vida é abundante e cheia de sentido, porque vive no sentido da Fé.
 
E, por força da Fé, que leva à confiança e à esperança em Deus, essa aceitação nunca é passiva, estática, mas sim activa e dinâmica, e como tal luta para obter, segundo a vontade de Deus, tudo o que necessita para ter a vida e «vida em abundância Jo 10,10».
 
E assim também, por força dessa dinâmica, nasce a necessidade interior de testemunhar a Fé, para que no amor a Deus, que é vivido também necessariamente no amor aos outros, os outros possam perceber como a Fé transforma a vida e lhe dá sentido, abrindo-se assim também eles ao Dom de Deus.
 
Assim como nos exorta o Papa Bento XVI, na Carta Apostólica “Porta Fidei”:
 
«Por conseguinte, só acreditando é que a fé cresce e se revigora; não há outra possibilidade de adquirir certeza sobre a própria vida, senão abandonar-se progressivamente nas mãos de um amor que se experimenta cada vez maior porque tem a sua origem em Deus.» Porta Fidei 7
 
«Simultaneamente esperamos que o testemunho de vida dos crentes cresça na sua credibilidade. Descobrir novamente os conteúdos da fé professada, celebrada, vivida e rezada e reflectir sobre o próprio acto com que se crê, é um compromisso que cada crente deve assumir, sobretudo neste Ano.» Porta Fidei 9
 
 
 
Marinha Grande, 30 de Outubro de 2012
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terça-feira, 23 de outubro de 2012

A FÉ

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Posso acreditar num deus só por mim, só pela minha razão?
 
Por exemplo, ao olhar para o universo, para a terra, para as plantas, os animais, a vida, os homens, posso com alguma facilidade acreditar que existe um ser superior, a quem posso chamar deus, que tudo criou do nada, o tudo que depois foi evoluindo.
 
De alguma forma, a minha razão de pessoa comum, (mais correcta ou menos correcta), leva-me a acreditar que esse ser superior, esse deus, tem que existir, para que tudo tenha sido criado e evoluído.
 
E isso é ter Fé?
 
Não, de modo nenhum!
Isso é ter uma crença, porque é algo que nos é ditado apenas por argumentos mais ou menos racionais que, fazendo-me acreditar que esse ser superior existe, não implica uma adesão de vida a esse ser, que neste “acreditar” não tem mais qualquer impacto na minha vida a não ser esse mesmo: acreditar que existe, ou existiu!
 
A Fé, ou melhor o Dom da Fé, é algo que vai muito para além desse “acreditar”, porque não se limita a acreditar, mas a crer implicando uma adesão de vida que reconhece em Deus o Criador Supremo, aquele a Quem tudo pertence, aquele a Quem tudo é devido.
 
É que a Fé vai para além do racional, (embora a razão não seja incompatível com a Fé, antes pelo contrário), porque a Fé é crer num Deus que se dá a conhecer aos homens em toda a Sua Revelação, desde os tempos mais antigos até à Sua revelação final em Jesus Cristo.
 
A Fé envolve o mistério e o mistério não é “resolvido” pela razão, por isso mesmo implica uma adesão que vai para além da capacidade humana, ou seja, o homem precisa de ser iluminado pelo próprio Deus para alcançar essa total adesão à Revelação de Deus.
 
Mas a Fé implica também, para além da adesão, um viver, que não é “estático” como numa crença, (acredito e pronto!), mas sim uma resposta, uma relação entre aquele que tem a Fé, e aquele que é objecto da Fé, Aquele que doa ao homem o Dom da Fé.
 
É possível explicar pela ciência a Encarnação do Filho de Deus, Jesus Cristo, no seio de Maria, sem ela ter “conhecido” homem?
É possível explicar pela ciência a Ressurreição de Jesus Cristo, morto e sepultado depois de três dias?
É possível explicar pela ciência a Presença Real de Jesus Cristo na Hóstia consagrada?
 
Claro que não, que a ciência não consegue explicar estes e outros mistérios do cristianismo, que apenas podem ser acreditados e aceites pelo homem a quem o próprio Deus concedeu o Dom da Fé.
 
E isso torna a ciência incompatível com a Fé?
Também não, porque para além de outros factores, a ciência pode demonstrar, por exemplo, que nos milagres eucarísticos estudados, a “matéria” guardada em relíquia é carne de coração humano, ou que no Santo Sudário há coisas inexplicáveis para a própria ciência, o que ajuda o homem a perceber, (se quiser, iluminado pela Fé), a mão de Deus nesses acontecimentos, ou seja, a presença de Deus no meio dos homens.
 
O acreditar do homem em Deus, como Dom da Fé, é sempre iluminado pelo próprio Deus, mas é sempre também ajudado pela inteligência do homem e pela sua experiência vivencial desse mesmo Dom da Fé, nessa relação pessoal e comunitária com o Deus que se faz presente na vida do homem.
 
Sabemos bem como as palavras que o homem usa são finitas, isto é, não conseguem muitas vezes descrever tudo aquilo que o homem sente e vive.
Quantos autores já tentaram descrever o amor, em prosa e verso, na pintura e na música, enfim em tudo aquilo que é possível ao homem.
Algum verdadeiramente já o conseguiu descrever do modo como cada um o sente, em toda a sua plenitude?
Não, porque há sempre algo que o homem sente e é impossível de descrever, porque as palavras não chegam, embora, no entanto, o homem ao viver o amor saiba que o está a viver, e disso tenha a certeza.
 
Como podemos nós então descrever a Fé?
Podemos ir ao Catecismo da Igreja Católica, ou aos documentos da Igreja, ou aos autores cristãos, e mesmo assim, aquele que tem o Dom da Fé e a vive verdadeiramente, nunca a consegue ver inteiramente retratada nas palavras que lê ou ouve.
 
Porque o Dom da Fé faz parte integrante da plenitude do homem que quer encontrar Deus e a quem Deus chama ao Seu encontro.
E leva a uma relação tão pessoal e íntima com Deus, que se torna impossível de descrever em palavras humanas, mas que pode e deve ser testemunhada, e por isso mesmo o Dom da Fé se “completa” na sua dimensão comunitária.
 
Pode alguém descrever inteiramente um momento de união mística suscitada, por exemplo, num momento de oração ou de comunhão, em que a presença de Deus se torna tão real, que o mundo, (com tudo o que ele representa), desaparece nesse instante?
Vários Santos descreveram momentos desses, testemunhando-os com uma força tal, que nos apetece por vezes sentir transportados para viver esses momentos!
Mas se os experimentamos em nós próprios, não percebemos então que as suas palavras não conseguiram afinal descrever a plenitude de tais momentos?
 
Esses testemunhos, bem como aqueles que vimos e ouvimos no dia-a-dia das nossas vidas, nas comunidades em que vivemos, devem levar-nos a procurar cada vez mais viver o Dom da Fé com que fomos agraciados, para encontrarmos a plenitude da vida que nos foi dada, em Deus e por Deus.
 
«Felizes os que crêem sem terem visto» Jo 20,29, disse Jesus a Tomé, perante a sua incredulidade, que logo foi vencida pela Fé que o levou a exclamar a primeira profissão de fé na divindade de Cristo: «Meu Senhor e meu Deus» jo 20,28
 
Ou ainda como nos escreve São Pedro na sua primeira Carta:
«Sem o terdes visto, vós o amais; sem o ver ainda, credes nele e vos alegrais com uma alegria indescritível e irradiante, alcançando assim a meta da vossa fé: a salvação das almas.» 1 pe 1, 8-9
 
E não é exactamente isso que nós experimentamos, quando vivemos o Dom da Fé que Deus nos concede?
 
Nas alegrias, na saúde, no bem-estar, mas também, apesar das provações, das dificuldades, das tristezas, de tudo o que a vida no mundo nos proporciona, a nossa confiança, a nossa esperança, a nossa certeza, reside em Deus, no Seu amor por nós, que o Dom da Fé, vivido intimamente e em comunidade, nos confirma nos nossos corações.
 
Por isso é tão verdadeira e bela a frase do nosso Bispo D. António Marto, na sua Nota Pastoral deste ano:
«A fé é bela porque torna bela a vida e é fonte de autêntica alegria» “O Tesouro da Fé, Dom para Todos”.
 
 
Marinha Grande, 15 de Outubro de 2012
 
 
Nota:
Texto meu publicado no Boletim da Paróquia da Marinha Grande, "Grãos de Areia", este mês.
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terça-feira, 16 de outubro de 2012

POR VEZES, SENHOR …

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Por vezes, Senhor,
sinto tão fundo o Teu amor…
 
Ainda há pouco,
logo depois da comunhão,
parecia que ajoelhado a Teus pés,
repousava a cabeça no Teu colo,
e Tu me afagavas o cabelo,
ou melhor,
me fazias festas no coração.
 
Estarei louco?
Não tenho dúvidas que estou,
mas louco de amor por Ti!
Todos os momentos em que Te vivo,
me enchem,
mas sabem a pouco!
 
Eu sei, Senhor,
que no Teu infinito amor,
me dás estes momentos,
para eu perceber,
que na graça da secura,
que tantas vezes me toca,
me confrontas,
me provocas,
me alimentas,
na permanente procura.
 
Então,
porque tantas vezes Te nego
com as minhas atitudes,
com as minhas ausências,
com a minha falta de amor,
àqueles que de mim precisam,
e perante a sua dor,
fico mudo, surdo e cego?
 
Como posso eu querer
guardar apenas para mim
a alegria de Te sentir,
no meu viver,
no meu crer,
no meu existir.
 
Dar-Te como,
se indigno de Ti,
não Te posso reflectir?
 
Amaste-me primeiro,
porque sem o teu amor,
eu não poderia amar,
com o amor verdadeiro!
 
E é nesse amor com que me amas,
nesse amor com que Te dás,
que por Tua graça reflicto,
a alegria de Te ter,
o sentido do meu viver,
a confiança, a esperança,
a certeza da Tua paz.
 
Por vezes, Senhor,
sinto tão fundo o Teu amor…
 
 
 
Monte Real, 16 de Julho de 2012 
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