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Que porcaria de vida, pensou ele com os seus botões.
Afinal era tão bom a dar conselhos e não os conseguia aplicar na sua vida.
Tinha tentado controlar tudo tanto e tão bem, que acabou por fazer o vazio à sua volta e nada mais lhe restava a não ser um pouco do seu orgulho e teimosia em viver assim.
Nada lhe faltava financeiramente e até tinha muitos amigos.
Quando pensou nos amigos sorriu interiormente porque tinha bem a noção de que os amigos que tinha, nada tinham a ver consigo, pois eram fruto apenas da vida dispersa que levava e, verdadeiramente, se precisasse deles nenhum apareceria.
Nem a família lhe restava, porque ao tentar controlar tudo e todos, a mulher e os filhos tinham acabado por se afastar de si.
Afinal tinha tudo e … não tinha nada.
Era dia vinte e quatro de Dezembro, e a véspera de Natal fazia-o sentir-se ainda mais sozinho e desamparado.
Longe iam os tempos em que em família celebravam o Natal com paz e alegria, mas agora tudo isso era apenas recordação.
Já que assim é, pensou ele, vou jantar a um bom restaurante, comer e beber do bom e do melhor e depois … depois volto para casa sozinho, claro.
Telefonou para o restaurante a marcar mesa para jantar e ficou um pouco incomodado quando lhe perguntaram se a mesa era só para uma pessoa, mas não pensou mais nisso.
Vestiu-se a preceito e saiu para o frio da rua, rumo ao restaurante.
Entrou no restaurante e indicaram-lhe a sua mesa
Sentou-se e reparou que na mesa ao lado estava outro homem sozinho também.
Apetecia-lhe muito meter conversa com ele, mas não encontrava motivo para tal
A certa altura um papel qualquer caiu da mesa do seu “vizinho” e ele aproveitou para chamar a atenção do outro para isso.
O “vizinho” agradeceu e isso deu azo a conversarem um pouco sobre várias coisas, até à constatação de que afinal estavam os dois sozinhos na noite de Natal
Convidou o outro para a sua mesa e ele de pronto aceitou.
A conversa foi fluindo e o seu colega de mesa disse-lhe que estava sozinho na vida, sem família, e inevitavelmente acabaram por falar do Natal, referindo o outro, no entanto, que estava com uma certa pressa pois queria ir à Missa do Galo, que era uma tradição sua desde menino a que não queria faltar.
Ele respondeu de imediato que dantes também ia sempre a essa Missa e então o outro convidou-o para irem juntos nessa noite.
Sem perceber muito bem porquê acedeu ao convite, e depois de jantarem saíram para a rua em direção a uma igreja que ficava ali perto.
Entraram e deixaram-se ficar pelos bancos logo à entrada da igreja.
Vários sentimentos tomaram conta dele à medida que a Missa avançava, e deu por ele a pensar que se sentia ali muito bem e com umas saudades imensas da sua família.
Fez um esforço para reter as lágrimas e deixou-se envolver por aquele momento.
De tal modo estava enlevado pelo momento que não se apercebeu que a Missa tinha acabado e o seu novo amigo olhava para ele à espera de uma qualquer resposta da sua parte.
Sentiu então uma mão no seu ombro e ao voltar-se para ver quem era, deu com a cara da sua mulher que, acompanhada dos seus filhos, saíam da Missa naquele momento.
Os filhos abraçaram-no com força e ele, desta vez, não conseguiu reter as lágrimas que lhe correram pela cara abaixo.
A sua mulher perguntou-lhe então se estava sozinho e, perante a sua resposta afirmativa, disse-lhe que ela e os seus filhos gostariam muito que ele fosse lá a casa cear nesse dia.
Surpreendido disse logo que sim, mas referiu que tinha aquele recente amigo que também estava que estava sozinho naquela noite.
Claro que o convite de imediato se estendeu ao amigo recente, que de pronto aceitou, sem se fazer rogado.
Já em casa, sentados à mesa, antes de começar a ceia a sua mulher pediu-lhe para ele fazer uma pequena oração.
Envergonhado e tímido disse então: Obrigado, Jesus, que hoje me trouxeste para o presépio da minha família e me deste mais um amigo, rompendo assim a minha solidão.
Numa certa gruta em Belém, dois mil anos antes, que agora se faziam presente, Jesus, Maria e José sorriam felizes com o Natal daquela família.
Marinha Grande, 24 de Novembro de 2025
Joaquim Mexia Alves
Com este Conto de Natal desejo a todos que visitam esta página e às suas famílias um Santo e Feliz Natal.
Nota: As fotografias são do presépio da igreja da minha paróquia da Marinha Grande.
Um presépio em construção ao longo do Advento.
As fotografias são do meu pároco, Padre Patrício, mas o pobre arranjo das mesmas é meu, que não tenho jeito para estas coisas.

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