terça-feira, 3 de agosto de 2010

«A CÉSAR O QUE É DE CÉSAR E A DEUS O QUE É DE DEUS» Mc 12,17

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«o imperador e Jesus personificam duas ordens diferentes de realidades, que não devem necessariamente excluir-se uma à outra pois, na sua contraposição, encontra-se o rastilho de um conflito que tem a ver com as questões fundamentais da humanidade e da existência humana. «Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus» (Mc 12,17): dirá Jesus mais tarde, exprimindo assim a essencial compatibilidade das duas esferas. Quando, porém, o império passa a interpretar-se a si mesmo como divino – implícito já na auto-apresentação de Augusto como portador da paz mundial e salvador da humanidade – então o cristão deve «obedecer antes a Deus do que aos homens» (Act 5,29)»
Jesus de Nazaré – Joseph Ratzinger – Bento XVI



Muitas pessoas têm citado a passagem bíblica, «Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus» (Mc 12,17), para de alguma forma tentarem respaldar a feitura e aprovação de leis iníquas, como a “lei do aborto”, “lei do casamento homossexual”, etc., afirmando que o governo, e a feitura das leis, competem aos homens segundo a sua vontade, tentando demonstrar com essa citação que essa seria a vontade de Deus, ou seja, que os homens governassem e fizessem as leis segundo a sua própria vontade.

E realmente Deus, tendo-nos criado em liberdade, não interfere na governação dos homens, mas não “avaliza” todos os actos dos homens que governam e legislam.

Porque sendo as duas esferas, (para citar o Papa), compatíveis, só o são na medida em que o homem reconhece a Deus a primazia sobre o homem e a vida.
E se falarmos então em políticos cristãos, esta verdade tem de ser indestrutível, pois só se é verdadeiro cristão se em tudo na sua vida se der a primazia a Deus.

E o Papa, nesta pequena passagem deste seu livro, mostra-nos com uma perfeita clareza o porquê desta frase bíblica não poder ser “utilizada” para respaldar leis que vão contra a vida, tal como ela foi criada e desejada por Deus.

É que quando o homem legisla sobre o direito à vida, (lei do aborto, por exemplo), e sobre o modo como ela foi desejada e querida por Deus, (lei do “casamento” homossexual, por exemplo), está a transformar-se em “Augusto”, ou seja está a querer divinizar-se e ser senhor daquilo que pertence apenas e só a Deus.

E desta verdade não há, (ou não deve haver), a menor dúvida para qualquer cristão que acredita que o Senhor e Criador da vida é Deus, e que, por isso mesmo, o homem não tem o direito de ir contra a vida que não lhe pertence, e ainda, que todo o cristão perante este tipo de leis deve «obedecer antes a Deus do que aos homens» (Act 5,29).

E assim, mais uma vez, esta verdade torna-se mais premente e obrigatória para aqueles que sendo cristãos, foram chamados ao governo das nações, à feitura das leis dos homens, pois que deveriam assumir essa missão como uma vocação que Deus colocou nas suas vidas, para também aí, (como em tudo), serem testemunhas da fé que afirmam viver.

Quando assim não procedemos, eles, os políticos, e cada um de nós que aceita e segue essas leis, rompemos com Deus, pois estamos a tentar colocarmo-nos em pé de igualdade com Ele, atacando o maior dom do Seu amor que é a vida de cada um, tal como por Ele foi criada e desejada.

Podemos “assobiar para o lado”, podemos fingir que não compreendemos, podemos argumentar milhentas razões para aprovarmos esse tipo de leis, podemos até distorcer a nossa consciência como cristãos, mas no fundo quem segue Jesus Cristo, e com Ele, a Ele e n’Ele comunga, reconhece sempre no seu íntimo, onde Ele habita, que deve sempre «obedecer antes a Deus do que aos homens» (Act 5,29).


Monte Real, 3 de Agosto de 2010
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10 comentários:

Utilia Ferrão disse...

Amigo Joqim
Deus em primeiro.
Tens razão, mas a verdade é que nem todos pensam assim.
Sou contra o aborto, e em nenhuma circunstância se deve matar um ser humano e muito menos aqueles que são incapazes de se defender.
Quanto ao aborto terapeutico isso já é competência dos peritos na matéria.

Respeito as escolhas de cada individuo,mas certamente que não chamaria tal relação, um casamento, sou católica e o casamento é outra coisa, apesar de ter convivido com muitos casais homosexuais.
Abraço em Cristo
Utilia

Dulce Gomes disse...

Olá Joaquim.
Foca aqui dois temas principais, entre outros. O da lei do aborto e o casamento homossexual. Aos dois digo um não peremptório, mas não sem acrescentar que, no que toca ao que mais me diz, porque se trata do direito ou não de nascer, também tem muitas nuances, embora nenhuma delas desculpabilize o acto em si o que é certo é que nem todos os casos são iguais...é lamentável que não se dê condições de ajuda para nascer mas se dê todas as condições e tudo se aprove para um "casamento" entre pessoas do mesmo sexo.

A sociedade está toda distorcida levando o achar que tudo é natural em detrimento dos valores.
Abraço amigo em Cristo e Maria.

Jorge nOVO disse...

Olá Joaquim
Pois a vida tem estas dimensões da relação com Deus e com os outros, e estas dimensões estão interrelacionadas e interdependentes.

A consciência individual acerca de assuntos legais (da relação com os outros) está impregnada da dimensão moral de cada um, portanto da dimensão religiosa.

Este livro, de Bento XVI é realmente espectacular, e a mim abriu-me janelas pelas quais vi melhor.

Cumprimentos ,
Jorge Novo

Unknown disse...

Obrigado Joaquim por mais um texto lacónico e realista.
É tão verdade que muitas vezes somos apenas cristãos das nove às cinco, quando Jesus nos pede uma adesão a tempo inteiro, enfrentando todas as vicissitudes...

Quanto à moralidade e ao legalismo já sabemos, tantas coisas vão de mal a pior: em causa está sempre o "pecado das origens" - queremo-nos tornar deuses.

obrigado
Pe. JAC

malu disse...

É que quando o homem legisla sobre o direito à vida, (lei do aborto, por exemplo), e sobre o modo como ela foi desejada e querida por Deus, (lei do “casamento” homossexual, por exemplo), está a transformar-se em “Augusto”, ou seja está a querer divinizar-se e ser senhor daquilo que pertence apenas e só a Deus.

Dizes bem mas infelizmente é esse o panorama real e lamentável ver quem se afirma católico e na hora, despreza a Sua Palavra : «a Escritura não pode ser desprezada» - (conf. Jo 10,34)

Em outras passagens da Bíblia, lemos também e como atrás referes, sobre a lei do “casamento” homossexual recentemente aprovada:

«Não te deitarás com um homem, como se fosse mulher: isso é uma abominação." "Todos aqueles, com efeito, que cometerem qualquer dessas abominações, serão cortados do meio de seu povo.» (Levítico 18,22; 29).

«Se um homem dormir com outro homem, como se fosse mulher, ambos cometerão uma coisa abominável. Serão punidos de morte e levarão a sua culpa.» (Levítico 20, 13)

«Por causa disso, os entregou Deus a paixões infames; porque até as mulheres mudaram o modo natural de suas relações íntimas por outro, contrário à natureza; semelhantemente, os homens também, deixando o contacto natural da mulher, se inflamaram mutuamente em sua sensualidade, cometendo torpeza, homens com homens, e recebendo, em si mesmos, a merecida punição do seu erro» (Romanos 1,26-27).

«Não vos enganeis: nem impuros, nem idólatras, nem adúlteros, nem efeminados, nem sodomitas... herdarão o reino de Deus» (1 Coríntios 6,9-10).


E é só ver 'Augustos' a 'assobiar para o lado...'

Abraço em Cristo e Maria.

joaquim disse...

Amiga Utilia

Obrigado pelo teu testemunho fruto de uma vida real e vivida.

Realmente o que eu quero frisar para além do óbvio, é este erro que se instalou entre alguns cristãos, que lhes é licito legislarem ou concordarem com legislação que vai contra a a Fé e a Doutrina que afirmam professar.

Um abraço amigo em Cristo

joaquim disse...

Amiga Dulce

O que eu queria realemente chamar a atenção como digo na resposta à Utilia, é que não se é cristão na igreja e outra coisa qualquer na assembleia da república ou outro qualquer lado.

Obrigado pelas tuas palavras.

É preciso ter em conta que a Doutrina, o Catecismo, é o guia do cristão, mas que a Igreja analisa com certeza cada caso, consoante as suas envolvências.
Por isso mesmo não exclui, aconselha e propõe.

Um abraço amigo em Cristo

joaquim disse...

Meu caro Jorge Novo

Em primeiro lugar obrigado pela visita e comentário, que julgo ser o primeiro.

Concordo consigo, no entanto e como muito bem explica Bento XVI, saliento que, quando o homem legisla em assuntos que envolvem a vida dom de Deus, se é cristão, tem sempre que colocar Deus primeiro e a sua vontade porque só assim poderá obter o melhor para o homem.

Um abraço amigo em Cristo

joaquim disse...

Obrigado Padre José António

Disseste tudo!

Há realmente por aí uns cristãos em "part time"!!!

Um abraço amigo em Cristo

joaquim disse...

Obrigado Malu

"Assobiam" para o lado e estão convencidos, se calhar, que tendo o acordo dos homens, (de alguns claro), também o têm de Deus.

Um abraço amigo em Cristo