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Jesus obrigou logo os seus discípulos a subirem para o barco e a irem à frente, para o outro lado, rumo a Betsaida, enquanto Ele próprio despedia a multidão. Depois de os ter despedido, foi orar para o monte. Era já noite, o barco estava no meio do mar e Ele sozinho em terra. Vendo-os cansados de remar, porque o vento lhes era contrário, foi ter com eles de madrugada, andando sobre o mar; e fez menção de passar adiante. Mas, vendo-o andar sobre o mar, julgaram que fosse um fantasma e começaram a gritar, pois todos o viram e se assustaram. Mas Ele logo lhes falou: «Tranquilizai-vos, sou Eu: não temais!» A seguir, subiu para o barco, para junto deles, e o vento amainou. E sentiram um enorme espanto, pois ainda não tinham entendido o que se dera com os pães: tinham o coração endurecido. Mc 6, 45-52
Diz-nos o Evangelho de hoje que eles ainda não tinham entendido o milagre da multiplicação dos pães, pois tinham o coração endurecido.
E nós, cristãos católicos deste tempo, entendemos nós o Alimento Divino que todos os dias nos é dado e nunca acaba?
Entendemos nós já, nos nossos corações, nas nossas vidas, o Jesus Eucarístico que todos os dias se dá aos homens para a sua salvação?
Parece-me bem que continuamos com o coração endurecido, talvez até mais do que tinham aqueles discípulos, pois eles ainda se espantaram com o poder do Senhor, que sobre as águas vencendo o vento contrário, vinha ao seu encontro.
Nós, neste tempo, parece que com nada do Senhor nos espantamos, e caímos na rotina de uma prática religiosa, afastada do amor, (a Deus e aos outros), arredada do testemunho diário em todos os momentos do dia-a-dia, iludidos pela convicção das nossas próprias capacidades e deixando-nos levar pelo “canto das sereias”, daqueles que pretendem fazer de Deus, da religião e da Igreja, uma “coisa” apenas pessoal, reservada, e que cada um pode interpretar e seguir como melhor entender, indo buscar o que lhe interessa, e repudiando o que lhe custa viver.
E, no entanto, o Senhor é o mesmo, e continua a caminhar sobre as águas das nossas dificuldades, contra o vento das nossas adversidades, e continua a dizer-nos todos os dias:
«Tranquilizai-vos, sou Eu: não temais!»
Mas nós temos receio, somos fracos, deixamo-nos levar pela corrente daqueles que não têm convicções e que fazem da Fé uma “fezada”, ou que nos rotulam como “indigentes mentais”, “manipulados” pela Igreja.
Vamos á Missa, em vez de participarmos, de celebrarmos a Missa.
Batemos com a mão no peito e pedimos perdão pelas nossas faltas e depois no dia-a-dia apoiamos aqueles que legislam o pecado e a ignomínia.
Deixamo-nos convencer de que a religião deve apenas ocupar o espaço reservado da nossa relação com Deus e não se deve reflectir na nossa conduta em sociedade.
Porquê?
Porque temos medo, porque temos vergonha, porque temos respeito humano, porque não somos capazes de enfrentar as nossas fraquezas e julgamos que obedecendo a leis civis iníquas, nenhuma falta nos pode ser assacada!
Mas qual é a nossa primeira condição:
Somos primeiro filhos de Deus, ou cidadãos do Estado?
É que se somos bons filhos de Deus, seremos sempre bons cidadãos do Estado, mas nem sempre os que são “bons” cidadãos do Estado, são bons filhos de Deus.
O Estado, se formos bons cidadãos, até nos pode pagar o funeral, mas a sua responsabilidade cessa a partir daí, pois nada mais pode fazer.
Mas a Deus interessa-nos o nosso todo, e mesmo depois da nossa morte física, continua a dar-nos a vida, e a vida em abundância.
Hoje pergunta-se muitas vezes as razões para que haja uma diminuição da vivência da fé em comunhão de Igreja.
Ora o Senhor é o mesmo, ontem, hoje e sempre.
A Igreja é a mesma, embora mudando os homens que nela comungam.
Se os tempos hoje são de perseguição envolvendo as mais diversas formas, também o eram nos primeiros tempos e a Fé e a Igreja cresciam todos os dias.
Julgo então que a resposta é só uma:
Falta de testemunho dos discípulos de Jesus Cristo, de hoje, que são todos os baptizados.
Naquele tempo, aqueles primeiros discípulos podiam ter o coração endurecido, mas davam testemunho do amor de Deus, entre eles e com os outros.
Nós hoje, continuamos com o coração endurecido, mas fechamo-nos naquilo que tantos chamam a “minha fé”, e o nosso testemunho é pobre e sem efeitos práticos, porque não nos deixamos “espantar” com as coisas de Deus.
Claro que no meio de nós, humanidade, há testemunhos heróicos, de verdadeiros martírios por causa da fé.
Mas a maioria esmagadora de todos nós, filhos de Deus em Igreja, vivemos acomodados nas nossas maneiras muito particulares e privadas de vivermos a fé, e como tal o nosso testemunho não existe e nada transmite aos outros, nem os exorta a procurarem o Senhor que caminha sobre as águas e espanta os homens com o Seu amor, dizendo-lhes:
«Tranquilizai-vos, sou Eu: não temais!»
Monte Real, 5 de Janeiro de 2011
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16 comentários:
Amigo Joaquim
Excelente reflexão e um grande testemunho de que não devemos ter medo.Temos medo, porque não acreditamos verdadeiramente.
Mesmo aqui à porta de casa,há perseguições e continuarão a existir,porque as forças do mal não desistem e em simultãneo seduzem fazendo-o de um modo súbtil.Por isso,hoje mais do que nunca é importante fortalecermo-nos com a palavra,com a oração e com a caridade.Em relação a esta há que partilhar e aprender a viver gerindo bem os dons que o Senhor nos dá, para que possamos repartir com outros de preferência de modo que a mão direita não saiba o que faz a esquerda.O que chega para nós,chega sempre para mais um ou dois.Eles viviam em comunhão de bens e nós?A maior parte das vezes temos medo que nos falte o supérfulo e eu não me excluo.
Um abraço e que Deus neste ano que agora começa continue a inspirar-te, proporcionandoa todos reflectirmos sobre o essencial da vida.
(…) Porquê? Porque temos medo, porque temos vergonha, porque temos respeito humano, porque não somos capazes de enfrentar as nossas fraquezas e julgamos que obedecendo a leis civis iníquas, nenhuma falta nos pode ser assacada! (…)
Acrescentaria… Porque também temos “telhados de vidro”! No entanto, se pensássemos que só os “puros” e “justos” poderiam testemunhar publicamente a sua fé em Cristo, quem com autenticidade o poderia fazer? Pelo Apóstolo chega a nós o conhecimento de que «onde abunda o pecado, superabunda a graça». Assim, cresce a nossa confiança na força que nos vem do Alto, capaz de nos transformar, recompondo os nossos “telhados de vidro” com a sabedoria do perdão, abrandando a nossa dureza com a mansidão e a humildade de coração, refazendo a nossa própria pessoa com o Amor paternal que nos torna «novas criaturas».
Sou um homem de esperança cristã, e por isso vejo por todos os lados, a par das tristezas dos pecados na Igreja e fora da Igreja, também as alegrias dos testemunhos de homens e mulheres que expressam a fé no Senhor, em comunhão com a Igreja Católica, nas suas relações familiares em privado; publicamente nos seus compromissos sociais e políticos; corajosamente expostos aos riscos destes tempos de um anticatolicismo sofredor. Anima-os a fé professada no Baptismo e confirmada: «Esta é a nossa fé. Esta é a fé da Igreja que nos gloriamos de professar, em Jesus Cristo, Nosso Senhor».
Agradecido pela tua reflexão,
um abraço,
com renovados votos de um Bom Ano 2011.
Gostei do comentário sobre este trecho do Evangelho sobretudo porque toca num ponto muito sensível de todos nós homens: o medo!
Só que, na minha pobre opinião, o medo das coisas de Deus será, antes, cobardia.
As pessoas, quase sempre, não têm medo nem de Deus, nem da Igreja, nem do Evangelho o são...é cobardes, porque sabem muito bem que se se deixarem envolver, como às vezes o coração lhes pede, "se complicam a vida".
Apraz-me apenas agradecer:
Obrigado Joaquim por mais um grande e necessário abanão!
Amigo Joaquim este texto abanou-me mesmo.
São palavras muito difíceis de engolir estas.
Talvez também realidades muito duras.
Mas estou de acordo contigo temos uma igreja de imagem mas o interior por vezes está vazio.
Mas mesmo assim nos grandes movimentos para ajudar os pobres os desamparados eu vejo muitos católicos.
Vejo também muitas pessoas a apoiarem doentes terminais muito volontariado católico.
Muitas organizações a ajudarem os necessitados.
Tem-se evangelizado muito estes últimos tempos não com palavras duras mas com exemplos de verdadeira caridade.
É um bom começo.
Peçamos a Jesus que nos ajude a vivermos mais partilhando o Pão.
Abraço em Cristo
Utilia
Belo texto Joaquim, obrigado.
A Verdade, sempre!
Ve pf as minhas dicas fotograficas em:
http://www.1000imagens.com/foto.asp?idautor=373&idfoto=160&t=2&g=&p=
http://www.1000imagens.com/autor.asp?idautor=373&t=4#portfolio
Abraco
Antonio
Concha
Obrigado pelas tuas palavras.
Graças a Deus que em todos os lugares ainda encontramos testemunhos de filhos de Deus, que O testemunham das mais diversas maneiras.
Um abraço amigo em Cristo
Caro Thiago
Obrigado pelas tuas sempre bem ponderadas palavras.
Que os "telhados de vidro" não sejam motivo nunca para não darmos testemunho, mas sirvam para nos irmos corrigindo e encontrando sempre o caminho que Deus nos dá.
«No entanto, se pensássemos que só os “puros” e “justos” poderiam testemunhar publicamente a sua fé em Cristo, quem com autenticidade o poderia fazer?»
Nem me passa pela cabeça um tal pensamento, até porque eu seria desde logo "excluído" de dar testemunho.
É muitas vezes esse testemunho daquele que não acreditava, que vivia longe e agora foi tocado pela graça de Deus, que melhor toca os corações "adormecidos/endurecidos".
E, claro, não quero transmitir a impressão que tudo está mal e que ninguém dá testemunho.
A verdade é que o testemunho existe, graças a Deus, em todos os lugares, mas muitas vezes mais na intimidade do que na sociedade.
Refiro-me mais à "massa anónima" dos cristãos que vivem uma religião rotineira, e mais de tradição familiar, do que de acção, na oração e nos actos, e que tantas vezes "ataca" cada um de nós.
Um abraço amigo em Cristo
Sim António, é muitas vezes o medo do que Deus "me vai pedir", que impede os homens de se empenharem mais, vivendo, como digo, a "sua" religião, ou seja, "aproveitando" o que lhes interessa e colocando de lado o que lhes é dificil.
Obrigado.
Um abraço amigo em Cristo
Padre José António, meu amigo.
Obrigado eu, pelo seu testemunho vivo de entrega a Deus e aos homens.
Um abraço amigo em Cristo
Amiga Utilia
Sem dúvida e digo acima, ou seja, que graças a Deus ainda há muita gente a dar bom testemunho da fé cristã.
Às vezes até, e perdoe-se-me o comentário, muito na acção e pouco na oração.
E a acção sem oração, não é completa, e por vezes só testemunha voluntarismo e não cristianismo.
Por isso e como muito bem dizes, rezemos e peçamos a Deus que nos vá iluminando em cada passo da nossa vivência da fé.
Um abraço amigo em Cristo
Meu caro António Macedo
Obrigado.
Julgo que é a primeira vez que aqui comentas.
Sê bem vindo!
Belas fotografias!
Gostei muito!
Um abraço amigo em Cristo
«Parece-me bem que continuamos com o coração endurecido, talvez até mais do que tinham aqueles discípulos, pois eles ainda se espantaram com o poder do Senhor, que sobre as águas vencendo o vento contrário, vinha ao seu encontro.»
Deveríamos ser como os Magos do Oriente ?!.
" Os Magos do Oriente que procuram Jesus, tendo a estrela a indicar-lhes o caminho para a verdade, para o amor , para Deus, são pessoas dotadas de uma tal sensibilidade interior, que as torna capazes de ouvirem e verem os débeis sinais que Deus envia ao mundo e assim rescindirem a ditadura dos costumes." Joseph Ratzinger, Jesus de Nazaré
Caro Jorge Novo
Obrigado pela visita e pela oportuníssima e justíssima citação do Papa Bento XVI.
Um abraço amigo em Cristo
Realmente a grande maioria de nós vive num marasmo de fezada...
Pois é Paulo
Somos muitas vezes cristãos "adormecidos", mornos...
E sabemos o que acontece aos mornos:
«Assim, porque és morno - e não és frio nem quente - vou vomitar-te da minha boca.» Ap 4, 16
Abraço amigo em Cristo
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