segunda-feira, 31 de maio de 2010

A GRAÇA DO PERDÃO

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Num destes dias enviaram-me uma mensagem que contava a história que abaixo reproduzo.

Conta uma história que dois amigos caminhavam pelo deserto. Num determinado momento da viagem, começaram a discutir. Um dos amigos deu uma bofetada no outro. Magoado, mas sem dizer nada, escreveu na areia: “Hoje o meu melhor amigo deu-me uma bofetada!”

Continuaram a caminhar até que encontraram um oásis. Decidiram tomar banho. O amigo que tinha sido esbofeteado começou a afogar-se, mas o seu amigo salvou-o. Depois de recuperar-se, escreveu numa pedra: “Hoje o meu melhor amigo salvou-me a vida!”

O amigo que tinha dado a bofetada e salvo o seu melhor amigo, perguntou: “Quando te magoei escreveste na areia. Porquê?”
O outro amigo respondeu: “Quando alguém nos ofende devemos escrever na areia, onde os ventos do perdão possam apagá-lo. Mas quando alguém faz uma coisa boa, por nós ou para nós, devemos gravá-la na pedra, onde nenhum vento possa apagá-lo”.

Fiquei a pensar nesta história, em como ela retrata bem, (ao contrário), esta situação nas nossas vidas.

Com efeito, quando alguém nos magoa, nos ofende, “guardamos” essa ofensa, essa mágoa e deixamos muitas vezes que ela tome conta da nossa vida.

Mas quando alguém nos faz bem, agradecemos na hora, talvez ainda recordemos um pouco, mas muito rapidamente esquecemos, e às vezes até com o passar do tempo começamos a desvalorizar a ajuda que nos deram, deixando que pensamentos como, “não fez mais que a sua obrigação”, ou, “eu também lhe fazia o mesmo se pudesse”, tomem conta de nós e vão apagando da nossa memória o bem que nos fizeram.

O curioso é que, quando guardamos a ofensa, a mágoa, ela vai tomando conta da nossa vida e vai crescendo na dor e na amargura, de tal modo que, muitas vezes nos começa a levar para sentimentos de vingança, ou no mínimo de sentimentos onde desejamos que aquele, ou aquela que nos fez mal, sofra também o que nós sofremos, ou talvez até mais um pouco.

Assim, normalmente o que fazemos é “escrever o mal que nos fazem na pedra, e o bem que nos fazem na areia”.

Percebemos então que somos muito mais vulneráveis ao mal, e à tentação que ele nos traz, do que apegados ao bem, e ao amor que ele nos quer fazer viver.

Mas o que é interessante e que nós a maior parte das vezes não nos apercebemos, é que o mal, a falta de perdão, quando o permitimos, nos vai envenenando a vida, nos vai tornando amargos, rancorosos, não só com quem nos ofendeu, mas também com aqueles que nos rodeiam, e que por isso mesmo se vão afastando de nós.
Por outro lado o bem, se o guardamos, traz-nos alegria, paz, serenidade e vontade de viver, que se vai transmitindo àqueles que nos rodeiam e os torna também a eles mais felizes e desejosos de estarem connosco e partilharem connosco as suas alegrias e tristezas.

Sabemos tudo isto, sentimo-lo sem dúvida, e no entanto quando somos ofendidos a nossa primeira reacção não é normalmente o perdão.

E no entanto se fosse, seriamos bem mais felizes!!!

Monte Real, 31 de Maio de 2010
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segunda-feira, 24 de maio de 2010

PEQUENEZ!

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Disseram-me ontem, Senhor, que eu sou muito grande e tapo a vista aos outros.
Não que isso me incomodasse, pois tenho-o ouvido tantas vezes, e em tantos momentos da minha vida.

Mas fiquei a pensar nisso, até porque naquela altura respondi com um sorriso a quem mo dizia:
«Sabe, tenho tentado como João Baptista diminuir, para que Ele cresça, mas pelos vistos não tenho conseguido.»

E agora, Senhor, fiquei mesmo a pensar se eu serei “realmente grande”, ou melhor, se ainda me acho “grande”, e assim sendo não deixo que Tu cresças em mim.

Era uma procissão, Senhor, e queriam ver a imagem de Tua Mãe que passava, vinda da Capelinha das Aparições para Leiria, e não conseguiam porque eu lhes tapava a vista.

E eu fico a pensar:
Será que nessa minha “grandeza”, eu não deixo que os outros vejam que estás em mim, como neles também?
Será que sou eu que apareço muito mais, do que Tu apareces em mim?
Será que eu dou muito mais testemunho de mim, do que eu faço, do que testemunho a Tua presença na minha vida e das maravilhas que fazes em mim?
Será que eu acho que sou capaz de fazer alguma coisa, se não fores Tu a fazer em mim, na minha disponibilidade e entrega a Ti e aos outros?
E será que eu estou disponível para Ti e para os outros?

Ah, Senhor, que ao olhar para dentro de mim, afinal ainda vejo mais o meu tamanho exterior, do que a minha pequenez interior, e por isso mesmo, Senhor, em vez de Te “mostrar” em mim, ainda tapo a vista aos que querem “ver-Te”!

Perdoa-me, Senhor e deixa que faça minha a oração de João Baptista, «Ele é que deve crescer, e eu diminuir.» Jo 4,30.
Que esta oração saia do meu coração como um compromisso assumido, que só se tornará realidade se eu for realmente disponível e entregue à Tua presença em mim.

Então, Senhor, serei tão pequeno que ninguém me verá, mas por Tua graça, somente verão a Ti.

Monte Real, 24 de Maio de 2010
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segunda-feira, 17 de maio de 2010

BENTO XVI - 2

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Desde a chegada a Lisboa, a Missa no Terreiro do Paço, a oração na Capelinha das Aparições, a entrada na igreja da Santíssima Trindade, (onde ansiosamente o esperávamos), a Missa no Porto e a despedida, que vou olhando para a figura, para a presença de Bento XVI, tentando perceber o que ela me faz sentir, o que ela me provoca, ouvindo as suas palavras e querendo deixar que elas me apontem caminho, me façam ver aquilo que ainda não vi e preciso ver, na minha caminhada de conversão diária.

E “vejo”, “vejo” claramente a passagem bíblica da “tempestade acalmada”, Mc 4, 35-41

A barca, (a Igreja), no meio da tempestade, as ondas alterosas atirando-se contra ela, fustigando-a de todos os lados, e «Jesus, à popa, dorme sobre uma almofada.» Mc 4, 38

Os homens estão cheios de medo, não sabem o que fazer, olham uns para os outros, interrogando-se nos olhares sobre como vencer aquela tempestade.

E Jesus dorme!

Jesus dorme, porque há uma diferença nesta passagem, tal como a “vejo” agora!

É que no meio da barca, serenamente, está um homem de pé, de branco vestido, que aponta o caminho, que diz aos homens como fazer, para não perecerem na tempestade.

Com uma humildade desconcertante, mas com uma firmeza constante, ensina como navegar, como aproveitar os ventos alterosos, como dominá-los, como converte-los em ventos de feição, em ventos de crescimento, em ventos de fazer caminho.

Não se perturba, o seu olhar é tranquilo, o seu sorriso é constante, as suas palavras são firmes, mas repassadas de amor, e de todo ele emana uma paz que se vai transmitindo aos outros.

Vai explicando que na barca há alguns que navegaram e navegam contra corrente, que se afastaram, e afastam da rota de marear, mas que é preciso retornar ao caminho, à rota inicial, àquela que leva a bom porto.

E calmamente vai dizendo que todos cabem na barca, os que foram prejudicados por uma rota errada, e também aqueles que erraram a rota.

A uns é preciso acolhê-los e amá-los, tentando dar-lhes o que lhes tiraram.
Aos outros é preciso fazê-los sentir que erraram, mas que ainda há tempo de corrigir a rota, e encontrar a navegação certa.

É que a barca é grande e tem muitos compartimentos, onde todos e cada um são precisos, com missões diferentes, mas todos trabalhando para a mesma navegação que fará chegar a barca a porto seguro.

A tempestade continua, as ondas ainda se abatem sobre a barca, mas os homens na barca começam a ganhar mais confiança, porque aquele homem de pé, de branco vestido, lhes transmite essa mesma segurança, quando lhes diz:
Não temais que esta barca nunca se afunda!

Fitam-no, alguns surpreendidos, outros incrédulos ainda, mas olhando-o nos olhos perguntam-lhe:
Como podes tu ter tanta certeza que a barca nunca se afunda?

E ele sorrindo, num sorriso tranquilo e confiante, aponta-lhes a popa da barca e diz-lhes em voz firme:
Não vedes que Ele está sempre connosco, até ao fim da viagem?!

E prossegue firme nas palavras a dizer-lhes, a dizer-nos, (é que nós também vamos na barca):
Não nos ensinou Ele a rota para o bom porto? Não nos ensinou Ele a navegar mesmo nas ondas alterosas e nos ventos contrários? Não nos disse Ele e nos mostrou ao dar a vida por nós, que nada nem ninguém pode nada contra a Barca que Ele construiu e contra as vidas daqueles que Ele criou?

E continua ainda sem desfalecimento:
Então o que esperais? Mãos à obra! É preciso voltar à rota inicial, à rota que Ele mesmo nos ensinou. Não nos disse Ele, que se n’Ele permanecêssemos, Ele permaneceria connosco? Não nos disse Ele que mandaria um Vento Novo que nos conduziria na navegação perfeita? Então deixemos que esse Vento Novo nos conduza, e poderemos ter a certeza que todos os outros ventos e todas as ondas se acalmarão, e chegaremos ao porto que não tem fim.

Olhando-nos nos olhos, diz-nos então sem uma única expressão de dúvida:
E sabeis como sei eu isto? É que Ele está ali, sempre, a dormir na popa, sem nunca nos abandonar!

Reparai, disse ainda:
Na Sua entrega por todos nós reside esta certeza de que o porto seguro nos espera e está sempre ao nosso alcance, porque neste dormir tranquilo, Ele nos diz que confia mais em nós, do que nós confiamos n’Ele. É que sabeis, Ele conhece-nos, bem melhor do que nós nos conhecemos, e nunca permite nada que esteja acima das forças que Ele mesmo nos deu!

E termina dizendo:
Confiai nisto que Ele nos diz sem cessar, «Foi-me dado todo o poder no Céu e na Terra. Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos, baptizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado. E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos.»Mt 28, 18-20

Marinha Grande, 15 de Maio de 2010
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quinta-feira, 13 de maio de 2010

BENTO XVI - 1

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Ontem estive em Fátima, na igreja da Santíssima Trindade para rezarmos as Vésperas com o Papa Bento XVI.
Foi algo que me foi oferecido e que eu agradeço a Deus do mais fundo de mim próprio.
Claro que tinha de escrever sobre tudo isto!
Sentado aqui, com este teclado na minha frente, deixo extravasar as minhas emoções e as minhas vivências destes dias.

Bento XVI é uma figura frágil, quase apagada, tímida, e no entanto a sua presença faz-se sentir e toma conta de nós.
João Paulo II apresentava-nos a fragilidade da doença que como um verdadeiro mártir abraçava, tenho a certeza por todos nós.
Bento XVI apresenta-nos também uma fragilidade, de tal modo que dá vontade de o proteger, mas quando olha, quando fala, quando ora, percebe-se a firmeza, a segurança, a radicalidade da entrega confiante.
Cada um dos seus gestos é uma expressão da interioridade da Fé que vive e à qual se entrega, e percebe-se que todos eles têm uma explicação doutrinal e catequética.
Nada é dito que não tenha importância e em todas as suas palavras há um profundo ensinamento.
Percebe-se, digo eu, que mesmo reconhecendo-se a si próprio como homem profundamente inteligente e de cultura absolutamente invulgar, reconhece que nada disso serve para nada se não for iluminado pelo Espírito Santo que o conduz.
E percebe-se isso, digo eu, porque cada momento de pausa, (e ele provoca muitos momentos de pausa), são passados em profunda oração, como a esperar a condução do Espírito para o próximo momento.
Poderemos dizer que as homilias já estão escritas, é certo, mas atrevo-me a dizer que foram escritas em oração e iluminadas pela oração que constantemente toma conta dele.
O sorriso é tímido, quase envergonhado, mas é ao mesmo tempo de uma humildade confiante, desconcertante.
O brilho nos olhos muito vivos, revela uma paz e uma confiança que vão muito para além das suas capacidades, porque são a certeza do Emanuel, o Deus connosco, que ele não cessa de repetir à saciedade: Jesus Cristo está connosco, está no meio de nós!
E as suas palavras revelam isso mesmo.
Num mundo que quer encontrar um deus que sirva as suas necessidades, Bento XVI afirma-nos contra a corrente que provavelmente andamos enganados, pois Deus não se encontra fora, mas sim e primeiro dentro de nós e nos outros.
Afirma aos sacerdotes e a todos nós, que Deus se encontra em nós na oração, na prática diária do amor, e não na azafama das coisas que não têm a ver com a missão, seja ela sacerdotal, seja ela a de simples leigos discípulos de Cristo.
Essas virão por acréscimo, e serão abençoadas por Deus, porque se Ele vive em nós, também por Ele são queridas e abençoadas.
É o recentrarmo-nos em Cristo, fonte, princípio e fim de todas as coisas, porque só n’Ele, com Ele e por Ele, essas mesmas coisas têm sentido.
Em Fátima mesmo sem o dizer, ele diz-nos que Maria só pode ser entendida e “usufruída” quando iluminada por Cristo.
E então, quando assim é, que poderosa intercessora, que insigne advogada, temos na Mãe que o próprio Senhor nos quis dar.

Ao ouvir, ver e tentar perceber Bento XVI, questiono os meus saberes, as minhas certezas, e fico incomodado com as minhas vaidades e os meus orgulhos, percebendo então que nada sou e que só quando me entrego verdadeiramente a Jesus Cristo, tudo o que me foi dado saber, aprender e viver, tem sentido e pode servir aos outros.

Esta será para mim uma primeira lição, e que importante lição, saber que devo viver na entrega constante, porque só quando me entrego totalmente e deixo que Deus faça em mim, eu sou verdadeira “imagem e semelhança” d’Ele, e que só assim posso ser para os outros o que Jesus Cristo é para mim e em mim.

Monte Real, 13 de Maio de 2010
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sexta-feira, 7 de maio de 2010

DEUS NÃO SE ENCONTRA NO MEDO

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Recebi recentemente um pps em que, para se afirmar a presença de Deus no mundo, se enunciavam algumas situações de pessoas e atitudes, (como por exemplo o Titanic), que teriam “desafiado” Deus e acabaram por morrer, ou acabaram por ter alguma “desgraça”.

Julgava eu que esse tipo de argumentos, (Deus castiga!), já tinham desaparecido das mentes dos cristãos e católicos, tanto mais que esse caminho há muito foi abandonado do ensino da catequese das crianças e dos adultos.

Deus, o nosso Deus, Aquele em quem acreditamos, é um Deus de amor e não um Deus de vingança mesquinhas contra aqueles que o repudiam ou até contra Ele se encarniçam.

Deus, o nosso Deus, Aquele em quem acreditamos, é um Deus de braços abertos sempre pronto a acolher a todos, mesmo aqueles que não O querem e repudiam.

Deus, o nosso Deus, Aquele em quem acreditamos, é um Deus que só se pode encontrar no amor e não no medo.

Se Deus se “vingasse” daqueles que não O querem e repudiam, onde estava então a liberdade em que nos criou?

Deus não obriga ninguém a n’Ele acreditar, a aceitá-Lo, a amá-Lo, a adorá-Lo, porque que nos criou livres, porque nos criou no amor.

Se assim não fosse, pobres de nós!

Deus, o nosso Deus, Aquele em quem acreditamos, é um Deus de amor e como tal “apenas é capaz” de amar!

Coisa bem diferente é estar sobre a protecção de Deus, porque n’Ele acreditamos, porque O amamos e adoramos, porque a Ele recorremos, porque com Ele e a Ele comungamos.

É que se a nossa vida for vivida em comunhão com Ele e com os outros, vivemos na confiança, na paz, na esperança, e então não há em nós desesperos, nem atitudes contra a vida, que tantas vezes nos condenam.

Mas não é Deus que nos condena, (Ele “apenas” nos ama), somos nós que nos condenamos ao vivermos dependentes da carne, que leva à dependência e à escravidão dos vícios.

E o resto, o resto é parte da vida deste mundo, onde tantas vezes encontramos “icebergues” que nos querem afundar, mas que, se estivermos em comunhão e paz com Deus, longe de ser uma desgraça, é um caminho de crescimento, e mesmo que pereçamos, nunca é o fim, mas sim um começo de uma vida nova que nunca mais acaba.

E essas mensagens que aqui refiro acabam sempre com dois tipos de “advertências”, como que a exigir-nos que as façamos passar a outros, coisa que nunca faço.

Por um lado tentam fazer chantagem, dizendo coisas como: “Se és amigo de Jesus…, se tens coragem…”, e por aí fora. Por outro lado, ameaçam, tal como: “Se não fazes isto acontece uma desgraça, etc., etc.”

Deus ama-nos inteira e totalmente, não nos ameaça nem invoca a Sua ou a nossa amizade para nos exigir o que quer que seja.

Quem ama dá-se, comunga-se, vive-se, não faz chantagens, nem ameaças!

Por isso mesmo, Deus, o nosso Deus, Aquele em quem acreditamos, não se deixa “manipular” pelos homens, nem os “manipula”, mas “apenas” os ama, e quer ser amado, porque é Pai, para nos dar a vida em plenitude, a vida que não tem fim, a Vida Nova que se vive quando nos encontramos pessoalmente e intimamente com Jesus Cristo, no Espírito Santo.

Monte Real, 7 de Maio de 2010
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